segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Resenha

Hiperatividade: o "não-decidido" da estrutura ou o "infantil" ainda no tempo da infância

Almeida, S.F.C. Doutora em Ciências da Educação (Psicologia) e diplomada em Psicologia Escolar pela Université René Descartes, Paris V, Sorbone. Psicanalista. Membro Fundador de Percurso Psicanalítico de Brasília. Tem vários livros publicados

Obra resenhada por Leide

O texto traz a tona um dos problemas mais vexatório em nossos dias, a hiperatividade. A autora coloca que atualmente existe um aumento expressivo do diagnóstico de Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDA/H), nos contextos de escolarização tendo em vista um discurso normativo e nostálgico, onde a autoridade paterna e os limites não são mais claramente definidos. Por sua vez, o discurso médico contemporâneo, também advindo da psiquiatria biológica, se prende às noções de déficit, incapacidade, insuficiência e atém-se às disfunções da atenção, motricidade e aos problemas da esfera relacional para diagnosticar o TDA/H.
Menciona que no DSM IV as disfunções da criança, tem as mesmas disfunções descritas no TDA/H em diferentes estruturas clínicas e posições subjetivas, como na psicose, autismo ou na debilidade intelectual. Essa lógica diagnóstica, enfatiza a função/disfunção, ignorando o sujeito, podendo dessa forma, diagnosticar a agitação psicomotora de uma criança psicótica como sendo transtorno de hiperatividade.
Em seu artigo, a autora escreve que há adesão maciça da prática médica à lógica curativa e, se respalda na concepção de que haveria efeitos benéficos da terapêutica medicamentosa para os portadores de TDA/H, uma vez que estes se sentiriam mais calmos e com maior autocontrole. Porém, há posição contrária a esta argumentação, alguns autores fazem sérias críticas a essa prática, destacando que a prevalência da postura terapêutica poderia encobrir problemas de ordem emocional do sujeito ou problemas ocasionados por situações sociais adversas (Graeff, 1989).
Tendo como parâmetro a psicanálise, o caminho mais prudente a adotar se pauta no entendimento de que a ordem simbólica, na qual os discursos sociais se inscrevem, cria possibilidades para o funcionamento de certas regularidades psíquicas e não de outras. A análise da relação sujeito/cultura permite uma reflexão acerca da problemática do TDA/H, na qual são consideradas as dimensões do sujeito e do social.
Segundo a autora, do ponto de vista da psicanálise, as funções psicológicas - inteligência, percepção, fala e motricidade, dentre outras - articulam-se entre si e são efeitos da configuração subjetiva do sujeito que, por sua vez, se constitui a partir dos significantes do Outro. A avaliação diagnóstica ancorada na teoria psicanalítica deve se ater à noção de estrutura, como se dá a inscrição do sujeito no discurso, tendo em vista que esses dois eixos implicam a subjetividade do analista em sua escuta e não possibilitam certezas, apenas hipóteses de trabalho
Na realidade as crianças com o diagnóstico médico de TDA/H aponta para uma organização estrutural indefinida, que esbarra nas delimitações das estruturas clínicas - neurose, psicose, perversão - sinalizando para uma posição subjetiva que está na borda, no limite das referidas estruturas. As manifestações sintomáticas do TDAH aponta para os efeitos do infantil, ainda não esquecido, não ainda recalcado.
A diferença que se faz presente nessas crianças aponta para uma indefinição do tipo de negativa essencial ao funcionamento psíquico. Neste caso, o não-decidido se manifesta pela ausência do não que não foi incorporado pela criança para coibir o desejo do Outro. Um não que seria capaz de lhe possibilitar uma organização psíquica outra e uma significação mais efetiva de si mesma e do mundo, a partir do referente simbólico.
Para explicitar seu artigo a autora busca na fala de Rassial (2000, 1997a, 1997b, 1995) que postula que não se pode falar em estado-limite na infância, por ser este, sobretudo, o resultado de uma operação a ser feita no tempo da adolescência. Não obstante, pode-se supor e acompanhar os investimentos narcísicos nas operações lógicas constitutivas da imagem do corpo e do pensamento que precederam essa fase e articulá-los às vicissitudes e dificuldades localizadas nas duas operações de constituição do eu: na formação do eu-ideal, na qual a função materna teria um papel relevante, e na instância do ideal-do-eu, resultante da Lei paterna.
A autora coloca que a problemática do TDA/H pode ser pensada como uma manifestação do infantil ainda no tempo de infância e que, ao se mostrar durante o processo de escolarização, é facilmente capturada pelo discurso e diagnóstico médicos face aos inúmeros encaminhamentos que o sistema escolar faz, na atualidade, ao se deparar com as "difíceis" crianças avaliadas como turbulentas e desatentas.
Em fim, para ilustrar o artigo e levar o leitor a uma reflexão mais profunda, a autora relatou em fragmentos clínicos um estudo de caso de uma criança diagnosticada como "portadora" de TDA/H. na rede pública do DF, sem levar em conta a subjetividade e que, o acesso a essa posição subjetiva possibilitaria à criança, na idade escolar, engajar-se na socialização e organizar o pensamento e as aprendizagens. Todavia, essa operação psíquica implica em uma divisão, a qual fará com que, a criança lide com constantes autocensuras e culpa em virtude das contradições impostas ao eu pelo desejo inconsciente agora esquecido.
Apreciação Crítica.
Dentro de contexto escolar, acontece com freqüência a queixa de professor com a fala “não aguento mais aquele garoto.... se a mãe dele não vier conversar comigo ele não entra na minha sala... ele é hiperativo e a mãe não procura um tratamento”. O TDAH é com freqüência apresentado do ponto de vista “meu” na sua grande maioria erroneamente, como um tipo específico de problema de aprendizagem e não é. Crianças com TDAH não são incapazes de aprender, mas têm dificuldade na escola por causa da falta de organização, de atenção e da impulsividade, Diante desses sintomas, a criança é levada a equipe denominada de multidisciplinar ( pedagogo, psicopedagogo, orientadora educacional e psicólogo) para fazer uma avaliação e posterior, ser encaminhada para um neurologista e conseqüentemente, ser medicada sem passar por uma escuta clínica, não respeitando sua subjetividade. É preciso que esse diagnóstico seja de fato, feito com mais cuidado e de preferência, após a criança passar um período em tratamento terapêutico.
A autora faz uma crítica veemente a prática desse discurso do diagnostico ao TDAH sem analisar os efeitos das relações sujeito/família, sujeito/escola, sujeito social e cultural na posição subjetiva da criança.

2 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Peço a gentileza de que me inclua como primeira autora deste artigo, tal como consta na publicação do periódico Estilos da Clínica, um vez que ele decorre de minha tese de doutorado defendida em 2003 na Universidade de Brasilia. Considero a exclusão do meu nome nesta resenha um desrespeito autoral.
    Prof Dra Viviane Neves Legnani - Professora Adjunto II da Universidade de Brasilia

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