segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Perguntas. Sobre Psicanálise e sua formação profissional!

Concluir o Curso de Psicanálise permite clinicar?
Sim. O curso permite que você tenha um consultório e exerça livremente a profissão de psicanalista.

O Curso tem registro no MEC?
Não. Nem tão pouco os demais cursos de formação em Psicanálise existentes no País. Inexistem, também, cursos de Psicanálise no âmbito universitário e sim Especialização Lato Sensu. Concluído, o psicanalista recebe um Certificado expedido pela Sociedade.

Quem é o Psicanalista junto á clientela e ao Ministério do Trabalho?
É um profissional que pratica a Psicanálise em consultórios, clínicas e até hospitais, empregando metodologia exclusiva ao bom exercício da profissão, quais sejam, as técnicas e meios eficazes da psicanálise no tratamento das psiconeuroses. Para atingir plenamente seus objetivos, o psicanalista deve ser uma pessoa com sólida formação humanitária, visto que a profissão requer uma acentuada cumplicidade entre analista e seu paciente. Os psicanalistas têm sua profissão classificada na CBO (Classificação Brasileira de Ocupações) no Ministério do Trabalho - Portaria nº 397/TEM de 09/10/2002, sob o nº 2515.50, podendo exercer sua profissão em todo o Território Nacional.

Por que o Curso é aberto às várias profissões?
É aberto porque nenhuma Lei especificou o contrário. Vale dizer, que desde o princípio era uma profissão aberta a quem se interessasse e que atraiu não só médicos - como Jung e Adler - mas também advogados, filósofos, literatos, educadores e teólogos, sociólogos e pedagogos. Por isso restringir a Psicanálise a essa ou àquela profissão é absolutamente contrário à ciência, ilegal e inconstitucional, pois “todos são iguais perante a Lei”.

O que regulamenta a profissão de Psicanalista?
No Brasil e no Mundo a psicanálise é exercida livremente e não é uma profissão regulamentada. Sendo assim, é uma profissão livre, reconhecida pelo Ministério do Trabalho e Emprego (CBO - código 2515.50), amparada pelo Decreto nº 2.208 de 17/04/1997, que estabelece Diretrizes e Bases da Educação Nacional e pela Constituição Federal nos artigos 5º incisos II e XIII. Repisando: pode ser exercida em todo o País.

O que faz o psicanalista?
Há uma grande necessidade de psicanalistas para orientar as pessoas na solução de seus problemas existenciais, tais como: fobias, ansiedades, depressões, obsessões, impulsos auto e heteroagressivos, angústias e crises de toda ordem. O profissional de Psicanálise ajudará a sociedade a ficar mais humana e a vida a ter mais sentido!

Quem poderá fazer o curso?
Médicos, Professores, Engenheiros, Odontólogos, Advogados, Assistentes Sociais, Pedagogos, Teólogos, Enfermeiros, Pastores, Padres, Psicólogos, Contadores, etc. Este curso é dirigido a todos os interessados em adquirir conhecimentos mais profundos em Psicanálise. Aos que querem aprender a dinâmica de seus problemas emocionais e afetivos de acordo com as teorias psicanalíticas, e aos que desejam dedicar-se à Psicanálise como Terapeutas e Clinicar.

O Curso de Psicanálise oferece titulação acadêmica?
Não. Nem tão pouco os demais cursos de formação em Psicanálise existentes no País. Inexistem, também, cursos de Psicanálise no âmbito universitário e sim Especialização Lato Sensu. Concluído, o psicanalista recebe um Certificado expedido pela Sociedade e pode atuar como psicanalista em todo país. No entanto, há sociedades que não emitem sequer uma comprovação de conclusão de curso. A SBPI cumpre à risca essa necessidade.

O certificado de conclusão do curso de Psicanálise é reconhecido em todo o território nacional?
O certificado é válido para que você atue como psicanalista em todo território nacional sem problemas legais.

domingo, 26 de fevereiro de 2012

A DEPRESSÃO – DOENÇA DO SÉCULO

Depressão é uma realidade deste novo século. A estatística é cada vez maior quando representa o número de pessoas atingidas pela depressão e estima-se o aumento futuro deste número visto a falta de conhecimento de muitos sobre a doença e seus sintomas, o que acarreta o desenvolvimento da mesma sem os cuidados preventivos. Geralmente por trás da depressão está muita frustração, muitos desejos não realizados. A mentira e a ilusão do querer e ser muito, próprios de nossa sociedade e de nossos dias, deixa no fundo da alma, um buraco vazio, onde se agigantam e agitam os fantasmas da ansiedade e da depressão. Os transtornos depressivos na sua grande maioria referem-se a “depressão maior”, ela pode ser leve, moderada ou grave com sintomas psicóticos ou não, e com sintomas físicos ou somente com sintomas mentais. "A depressão tende a ser uma doença predominantemente de mulheres - a proporção de mulheres para homens é 2:1. Estudos como esse indicam que a depressão tem características diferentes entre homens e mulheres, diz o Dr.Tuan Anh Nguyen, do Maricopa Integrated Health System (Arizona, Estados Unidos). É o transtorno mental mais comum em todas as comunidades no mundo. Pacientes com este tipo de depressão apresentam pelo menos cinco dos sintomas listados a seguir, por um período não inferior a duas semanas:
# Desânimo na maioria dos dias e na maior parte do dia (em adolescentes e crianças há um predomínio da irritabilidade).
• Falta de prazer nas atividades diárias.
• Perda do apetite e/ou diminuição do peso.
• Distúrbios do sono – desde insônia até sono excessivo – quase todo dia.
• Sensação de agitação ou languidez intensa
• Sentimento de culpa constante
• Idéias recorrentes de suicídio ou morte
• Baixo desempenho no trabalho
• Sensível prejuízo de manter atenção e concentração
• Constantes queixas, essencialmente de natureza hipocondríaca
• Visão pessimista do futuro

Outros fatores que contribuem para desencadear a depressão são: o stress, o perfeccionismo, o medo do fracasso ou do sucesso, desequilíbrios hormonais, falta de uma relação plena de confiança e cumplicidade, morte da mãe antes da adolescência, esgotamento, subnutrição, o álcool, problemas sexuais... Enfim, todos nós, estamos sujeitos a essa doença com nossas variações de humor. A depressão pode afetar qualquer ser humano, dependendo da complexa interação entre vulnerabilidades biológicas, condições ambientais, e condições sociais.
A depressão não tratada pode levar o óbito. Portanto, a pessoa deprimida, deve procurar ajuda psiquiátrica e concomitante, ajuda de um psicoterapêutica.
A clínica psicanalítica com pacientes deprimidos é rica e desafiadora segundo a Psicanalista Gicileide F. de Oliveira
Caros colegas do grupo de estudo da Apsibra,
Estamos retomando nosssos estudos.Estou vendo o melhor horário.
Abraço
Primeira e Segunda Tópica de Freud
e os Três registros de Lacan: Real -Simbólico-Imaginário

Quando Freud propõe a teoria topográfica, fica muito claro que ele vai tomar como axial a explicação do conflito intrapsíquico que é, muito especificamente, um conflito entre desejos sexuais e forças inibidoras, sendo que, tal conflito, vai desencadear a resistência característica em todo o processo analítico. Sua teoria mostrou ser uma descoberta importantíssima, pois apresenta a mente humana dividida em sistemas que ele demarcou.
Inconsciente – uma grandiosa fonte dotada de energia inconsciente; absolutamente livre, já que, caoticamente, age em cada ser humano, ora se apresentando como um feixe de representações que se mantêm à margem da consciência, ora como um invasor tumultuando a mente, despeja os seus derivados na consciência . Ele se caracteriza por serem os seus elementos inacessíveis à consciência; funcionar de acordo com as regras do processo primário; serem os seus resíduos mnésicos não-verbais; operar nos termos do princípio do prazer; estar relacionado com a ida instintual; caracterizar-se por um caráter infantil; ser atemporal.
Pré-consciente – compreende os elementos acessíveis à consciência. Refere-se a conteúdos que não se encontram presentes no campo atual da consciência, o que, então, o torna descritivamente inconsciente, Para que um elemento do sistema Inconsciente se torne consciente, é indispensável que, primeiro se torne pré-consciente, realizado pela associação a resíduos verbais correspondentes. Dessa forma, os elementos do Pcs, particularmente os resíduos mnésicos pertencentes a este sistema, são verbais por natureza.
Consciente – a percepção consciente é limitada a sensações provindas do mundo exterior; e sentimentos (afetos, emoções, pensamentos, lembranças, angústias etc) contidos no sistema Pcs. Para que um elemento do sistema Ics se torne consciente, é absolutamente indispensável que venha a receber catexia.
Freud percebe que na teoria Topográfica não havia correspondência entre certos fatos encontráveis no conflito psíquico. Então, cria a Teoria Estrutural com a finalidade de alcançar a dita correspondência, pela divisão da mente, de acordo com a experiência comprobatória de uma associação das funções psíquicas entre si, quando de situações de conflitos, ou seja, quando as muitas expressões do Ego, ante os conflitos, se apresentam desconexões, ou mesmo em nítida oposição.
Isto posto, a teoria Estrutural divide a mente em três grupos de funções que foram denominados de Id; Ego; e Superego, uma divisão que é feita de tal forma, que os principais tipos de conflitos mentais com os quais estejamos familiarizados, podem ser descritos como ocorrendo entre o Id de um lado, e o Ego e o superego do outro, ou entre o Ego e o Superego.
Id – é uma estrutura, é formado pelos representantes mentais dos impulsos instintuais e é, também, uma poderosa fonte de energia mental para todo ao aparelho psíquico Compõe-no também, os desejos, que exigem gratificação, o que resulta em impelir o Ego às ações, tendo-se, então aí, as suas duas características essenciais: ser formado pela energia e pelos representantes mentais dos impulsos. O id é regido pelo princípio do prazer.
Ego – é aquela parte da psiquê que se relaciona com o meio ambiente, funciona como mediador, integrador, harmonizador entre as pulsões do Id, as exigências, ameaça do Superego e as demandas da realidade exterior, com funções essenciais, na maior parte consciente para relacionarem-se com o mundo exterior tais como: percepção, pensamento, memória, atenção, antecipação, discriminação, juízo crítico, ação motora, e também, funções mais complexas, na maior parte inconsciente como: produção de angústias, mecanismos de defesa, fenômenos de identificação, formação de símbolos e como sede de representações que determinam a imagem que o sujeito tem de si mesmo, que estruturam o seu sentimento de identidade e de auto-estima.
Superego – define-se como um grupo de funções psíquicas ligado às aspirações ideais e às exigências e proibições morais. Sendo uma das divisões da mente, tem a sua origem na identificação com as figuras parentais, particularmente com os aspectos éticos e morais de ambos.
Assim sendo, como bem observou Freud, a acessibilidade à consciência não é um bom critério para basear a construção de sistemas psicológicos, então, a partir dessas considerações, ele propôs substituir a Teoria Topográfica que o critério é, meramente, o da acessibilidade à consciência, pela Teoria Estrutural que tem como critério, outro princípio: o do conflito de funções entre os instintos, a moralidade, a realidade e o Ego.
Na teoria lacaniana, o aparelho psíquico é uma estrutura única composta pelo Real e pelos registros do Imaginário e do simbólico, que se configuram em torno do furo inicial do objeto a. A tripartição estrutural real-simbólica-imaginário (SIR) estabelecida por Lacan desde a conferência pronunciada em julho de 1953 na fundação da Sociedade Francesa de Psicanálise “O Simbólico, o imaginário e o real” – foi objeto de contínua investigação até o fim de seu seminário. Essa tripartição, embora não compareça nomeadamente na obra de Freud, dela retira todo o seu alcance, de tal modo que, como afirmou Moustapha Safouan num artigo de imprensa publicado quando da morte de Lacan, em 1981, sem ela dificilmente se poderia entender a essência das teses freudianas sobre o psiquismo. Pode-se dizer que os três registros psíquicos dessa tripartição concernem três grandes segmentos da descoberta freudiana, como se as mais diferentes regiões da vasta obra de Freud pudessem confluir, todas elas, para cada um desses registros nomeados por Lacan. O próprio Lacan afirma, no seminário sobre Os escritos técnicos de Freud, que RSI são “categorias elementares sem as quais não podemos distinguir nada na nossa experiência”. Chegou a dizer também que “Freud não tinha do imaginário, do simbólico e do real a noção que ele tinha, mas mesmo assim, tinha uma suspeita deles... e que na verdade, pode extrair os três registros do discurso de Freud com paciência e tempo, começando pelo imaginário, depois mastigou a história do simbólico tendo como referência a lingüística e percebeu o famoso real, sob a própria forma do nó borromeano.
Na conferencia de 1953, SIR são apresentados como três registros muito distintos e essenciais da realidade humana. O Simbólico tem a ver com o saber em jogo na própria experiência psicanalítica, ele é responsável pelas “transformações tão profundas para o sujeito”. A partir da constatação de que a análise retira sua eficácia do fato de que “se desenvolve integralmente em palavras” O registro do Simbólico tem, na linguagem, sua expressão mais concreta, regendo o sujeito do inconsciente. Ela é a causa e o efeito da cultura, onde a lei da palavra interdita o incesto e nos torna completamente diferentes dos animais. Nos trabalhos de Freud, a importância do simbólico pode ser encontrada nos textos que ilustram o funcionamento do inconsciente, onde a casuística prova a maneira como é estruturado. Quanto ao Imaginário, surge para descrever apenas os ciclos instituais dos animais, nos quais se pode ver ocorrer certo número de deslocamentos, que significam um esboço de comportamento simbólico. O Real é apresentado desde já como “aquela parte dos sujeitos que nos escapa na análise” como aquilo que constitui o limite de nossa experiência, é sempre aludido pela negativa: seria aquilo que, carecendo de sentido, não pode ser simbolizado, nem integrado imaginariamente. Aquém ou além de qualquer limite, seria incontrolável e fora de cogitação. O real é o que retorna sempre ao mesmo lugar.
Muitos anos depois Lacan mostra que os três registros Real-Simbólico-Imaginário não podem ser isolados, uma vez que se apresentam unidos de modo indissociável na topologia do nó Borromeano em que os elos, estão amarrados uns aos outros de forma tal que, se cortamos apenas um deles, todos os outros se desligam simultaneamente.
Vale ressaltar que houve alteração na ordem das letras de SIR a RSI. Na primeira a primazia do Simbólico e na segunda a do Real. Da tríade dos registros ocorrida entre a primeira conferência em que Lacan pronunciava sobre ela em 1953, “o Símbolo, o imaginário e o real”, nesse período esteve aderido à idéia de destacar os elementos que constituem a estrutura do significante e sua lógica particular. O seminário de 1974-75, RSI, por si só já diz alguma coisa dos avanços produzidos por Lacan a esse respeito que recaiu nitidamente sobre o real enquanto o registro que rege e ordena a estrutura: a partir do real, presentifica-se o simbólico; a partir do simbólico, presentifica-se o imaginário. Mas a partir do imaginário também se presentifica o real.
Contudo, a alteração da ordem das letras trouxe certamente uma maior precisão à concepção lacaniana da estrutura. Vejamos: RSI: R - tudo começa a partir do real, ele constitui a base da estrutura do sujeito falante, S - o simbólico tem seu lugar efetivamente a partir do real. I– o efeito da introdução do simbólico é a possibilidade de constituição de imaginário, originalmente faltoso para o sujeito falante.
Essa tripartição para Lacan, não havia divórcio entre o prolongado trabalho com os nós e a prática psicanalítica. Cada uma das três categorias é autônoma e diferente das outras, embora todas elas estejam amarradas de forma interdependente.



Estudo com base na bibliografia de Lacan e Freud
Tema para discussão no grupo de estudo

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Psicol. educ. no.30 São Paulo jun. 2010

Psicanálise e educação: análise das práticas pedagógicas e formação do professor


Psychoanalysis and education: analysis of pedagogical practices and teacher training

Psicoanálisis y educación: análisis de prácticas pedagógicas y formación del profesor


Regina Lucia Sucupira Pedroza
Universidade de Brasília. E-mail: rpedroza@unb.br


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RESUMO
A relação entre psicanálise e educação vem possibilitando, desde que Freud demonstrou seu interesse pela pedagogia, melhor compreensão dos educadores sobre o desenvolvimento da criança e do adolescente. A premissa fundamental da psicanálise é a diferenciação do psíquico em consciente e inconsciente. Este trabalho objetiva apresentar possibilidades de atuações clínicas na formação do professor a partir da análise das práticas pedagógicas, visando oferecer condições aos professores para o enfrentamento de problemas do cotidiano escolar. Os grupos clínicos de análise das práticas docentes abordam a questão do cuidado e do terapêutico estabelecendo o grupo e a prática profissional como objetos de trabalho psicanalítico. Eles ocorrem no estabelecimento de ensino ou no contexto de formação continuada ou pessoal.
Palavras-chave: Psicanálise; Educação; análise das práticas docentes.
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ABSTRACT
The relation between psychoanalysis and education has existed since Freud demonstrated his concern for pedagogy. This allowed educators to have a better understanding of child and adolescent development. The fundamental psychoanalytical premise is the differentiation of the conscious and the unconscious. The goal of this work is to present possibilities for clinical practice on teacher training based on an analysis of pedagogical practices, in such a way as to allow teachers to face every day school issues. The clinical groups which analyze teaching practices address issues of care and therapeutics, establishing the group and the professional practice as psychoanalytic objects. They take place in the education establishment or in the context of continued education or personal development.
Keywords: Psychoanalysis; Education; analysis of pedagogical practices.
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RESUMEN
La relación entre el psicoanálisis y la educación viene, desde que Freud demostró interés por la pedagogía, posibilitando una mejor comprensión de los educadores sobre el desarrollo de los niños y de los adolescentes. La premisa fundamental del psicoanálisis es la diferenciación del psíquico en consciente e inconsciente. Este trabajo tiene como objetivo presentar posibilidades de actividades clínicas en la formación del profesor a partir del análisis de prácticas pedagógicas destinadas a ofrecer condiciones a los profesores para el afrontamiento de problemas del cotidiano de la escuela. Los grupos clínicos de análisis de las practicas docentes abordan la cuestión del cuidado y del terapéutico estableciendo el grupo y la práctica profesional como objetos de trabajo psicoanalítico. Ellos ocurren en el establecimiento de la enseñanza o en el contexto de la formación continuada o personal.
Palabras clave: Psicoanálisis; Educación; análisis de las prácticas pedagógicas.
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A relação entre psicanálise e educação vem de longa data, desde que Freud demonstrou seu interesse pela pedagogia na intenção de possibilitar uma melhor compreensão por parte dos educadores sobre o desenvolvimento da criança e do adolescente (FREUD, 1913). Os professores exercem grande influência sobre a criança por estarem investidos da relação afetiva primitivamente dirigida ao pai. Os sentimentos de admiração e de respeito são transferidos do pai para o professor, assim como a "ambivalência afetiva" que reside na antítese amor-ódio.
A transferência, primeiramente tratada na relação médico-paciente, foi vista por Freud como se dando também nas mais diversas relações estabelecidas pelo indivíduo na sua vida. Freud (1912a) fala de "clichês" ou "séries" psíquicas formadas pelo indivíduo a partir de vivências infantis e que determinam a modalidade especial de sua vida erótica. Dessa maneira, podemos dizer que o professor é objeto de transferência e está ligado a "protótipos", principalmente à imagem do pai, mas que podem também estabelecer-se conforme a imagem da mãe, do irmão, etc., ou seja, as pessoas estimadas ou respeitadas.
Freud, no artigo intitulado Prefácio à "juventude desorientada", de Aichhorn, de 1925, reconhece que as aplicações da psicanálise na teoria e prática da educação infantil despertaram grande interesse, trazendo importantes colaboradores para sua teoria. Em substituição ao estudo da neurose, com o qual a psicanálise iniciou seus estudos, a criança tornou-se o principal objeto de investigação para vários psicanalistas. Ainda que a contribuição pessoal de Freud tenha sido escassa no campo da pedagogia, ele considera o grande valor social do trabalho de seus colegas pedagogos (FREUD, 1925).
Mesmo sem nos ter deixado escrito algum sobre a educação, podemos dizer que, em toda a obra de Freud, há uma preocupação constante com as questões desse campo, no sentido de que a psicanálise, nascendo de uma prática clínica, constrói um corpo teórico fundamentando uma nova concepção de mundo e de homem, como ser histórico, social e cultural, e tenta compreender como se dá a inserção desse homem na cultura. Em diferentes artigos Totem e tabu (1912b), O futuro de uma ilusão (1927) e O mal-estar na civilização (1929), Freud expõe sua visão evolutiva tanto do indivíduo como da cultura, considerando o desenvolvimento do homem numa interação com o meio social.
O problema da educação sempre esteve presente no pensamento de Freud, sendo o texto de 1927, O futuro de uma ilusão, considerado como testamento pedagógico. A pressão que a sociedade exerce sobre o indivíduo desde sua infância, a partir da educação, faz com que a criança se conforme a uma realidade, que, é, de regra, a de dissimular sua investigação e seu conhecimento de tudo o que possa se relacionar à sexualidade. A finalidade da educação é a instauração do princípio de realidade, ou seja, é permitir ao indivíduo, submetido ao princípio do prazer, a passagem de pura satisfação das pulsões para um universo simbólico, que faz referência a uma lei, a lei da castração. A entrada no universo simbólico se dá pela linguagem. É pela mediação da palavra, à qual, desde sempre a criança encontra-se submetida, que é possível a simbolização das relações afetivas (ARMANDO, 1974).
É essa condição de ser submetido à linguagem que diferencia o homem dos outros animais, caracterizando-o em sua especificidade ao mesmo tempo em que permite a constituição de sua subjetividade. A psicanálise, ao colocar a linguagem como marca do humano, possibilita uma aproximação com as questões da educação, principalmente no que diz respeito à importância que o professor deve atribuir àquilo que a criança diz, bem como ao que é dito a ela.
Outra importante contribuição da psicanálise para a educação é encontrada em autores que foram influenciados também pela releitura lacaniana da obra de Freud. Mannoni (1973) observa que, na relação professor-aluno, é criada uma barreira entre o um professor "que sabe tudo" e um aluno "que não sabe nada", que garante e contém um conjunto de proteções e resistências. A pedagogia funciona como um drama que repete muitas vezes situações da família. Na escola, o desejo de saber do aluno se confronta com o desejo do professor, que está ligado a um ideal pedagógico colocado por ele mesmo, desde o início, e que se interdita ao mesmo tempo em que se mostra ao aluno. O professor espera do aluno um saber que lhe falta, e o aluno, por sua vez, se defende com medo de se ver frustrado no produto do seu trabalho. O aluno se encontra numa relação de poder, sujeito a um desejo inconsciente do professor, que pode chegar a ser bloqueador.
Para Mauco (1979), o educador age sobre a criança muito mais no nível do inconsciente do que do consciente. Ele não age apenas pelo que diz ou pelo que faz, mas sim pelo que é. As relações afetivas acontecem de formas variadas. Cada um procura satisfazer seus desejos inconscientes. Porém, a criança, por ser mais fraca psiquicamente, com um eu que deve se construir à imagem dos adultos em sua volta, é particularmente atingida pelos desejos inconscientes de seus educadores.
Sendo assim, podemos afirmar que não basta à criança possuir uma inteligência e uma saúde física satisfatórias para se desenvolver e se afirmar na aprendizagem escolar. É necessário também que tenha uma educação afetiva que lhe permita desenvolver uma sensibilidade relacional com os outros, podendo se servir de suas capacidades físicas e intelectuais. A escola é um meio de grande importância para o desenvolvimento das relações afetivas da criança com os adultos, assim como também com as outras crianças da mesma idade. É também na escola que a criança deve aprender a se relacionar com o outro em diálogo permanente, se constituindo em trocas com todos aqueles a sua volta (PEDROZA, 1993).
A criança, ao chegar à escola, traz consigo uma experiência relacional vivida com a família, com um inconsciente com todas as suas frustrações e recalcamentos de seu drama interior, com seus desejos, sua história, se exprimindo pela sua simbolização. A pedagogia, portanto, poderia procurar se articular com essa expressão simbólica do aluno a partir das múltiplas situações oferecidas pelo grupo escolar e suas diferentes formas de atividade, oferecendo à criança oportunidade de verbalizar suas tensões. É dessa maneira que a psicanálise pode ajudar o educador, permitindo a possibilidade de uma compreensão em profundidade do sujeito, no que ele tem de mais pessoal e de mais íntimo. Para tal, é necessário que a escola não mantenha os alunos numa relação de submissão passiva à autoridade do professor. Este deve lembrar que as dificuldades encontradas pelo aluno, na escola, podem ser de origem afetiva. A relação professor-aluno depende, em grande medida, da maturidade afetiva do professor. Se esta lhe permite resolver suas próprias dificuldades, ele poderá ajudar a criança a viver e a resolver as suas.
Mauco (1979) ainda acrescenta que, ao reagir afetivamente - "eles me põem doida" - o adulto perde sua superioridade e a autoridade de sua função educativa, que exige, ao mesmo tempo, "muito apego para compreender a criança, e muito desapego para não reagir subjetivamente" (p. 167). É numa relação de diálogo e de escuta que a educação será uma relação de respeito à pessoa da criança. Respeito e compreensão ao seu comportamento e às etapas de seu desenvolvimento psíquico e afetivo.
Para Bigeault e Terrier (1978), a contribuição da psicanálise para a educação é um fato, como também o é para outros campos, como a arte e a publicidade, por exemplo. Segundo esses autores, a psicanálise deu uma nova visão para os seguidores de Rousseau, os do movimento da Escola Nova, passando pela psicologia social. No entanto, ao mesmo tempo em que essas duas posições parecem se aproximar, há entre elas um grande abismo. O que falta nessas pedagogias modernas é considerar questões de grande importância para a psicanálise, tais como a frustração, a agressividade, o conflito e o Édipo, como constituintes da estruturação da personalidade. Por outro lado, elas se aproximam, principalmente, ao acentuar a importância da energia no interior do sujeito e sua relação com o mundo exterior.
A premissa fundamental da psicanálise é a diferenciação do psíquico em consciente e inconsciente. E sua grande utilidade é, sem dúvida alguma, a tentativa de trazer o inconsciente até o consciente levando as repressões e preenchendo as lacunas mnêmicas. Pois, como Freud (1915) nos disse, seu objetivo era de traduzir em teoria os resultados da observação, sem nenhuma obrigação de sua parte de alcançar, numa primeira tentativa, uma teoria completa que se recomende por sua simplicidade. Para a psicanálise toda e qualquer ligação do sujeito com o mundo significa investimento afetivo. Dessa maneira, são de grande importância para a educação os resultados das investigações psicanalíticas, que reivindicam para os processos afetivos a primazia na vida psíquica.
A revista de pedagogia psicanalítica, Zeitschrift für Psychoanlytische Pädagogik, que circulou entre 1926 e 1937, reuniu vários textos de célebres psicanalistas como A. Freud, S. Ferenczi, A. Balint e de outros terapeutas infantis e de adultos, de educadores e de professores. Estes se mostraram entusiasmados em relação às descobertas da psicanálise e buscaram se apoiar nos seus ensinamentos modificando seus olhares sobre eles mesmos e sobre suas práticas a partir de uma formação clínica ou de uma análise pessoal.
Nessa época, surge a formação do tipo clínico criada por M. Balint com os "grupos de análise da personalidade profissional" que eram destinados inicialmente aos trabalhadores sociais e aos médicos e que passaram depois a outras profissões, como a dos professores. Dessa forma, a psicanálise deixa de ser apenas direcionada a um tratamento com o objetivo da cura individual e passa a atuar em outros contextos, ocupando-se da elaboração psíquica.
Este trabalho tem como objetivo apresentar possibilidades de atuações clínicas na formação do professor a partir da escuta clínica de orientação psicanalítica das práticas pedagógicas, visando oferecer condições aos professores no campo da educação para o enfrentamento de problemas e situações do seu dia a dia na escola. Pois, pensar a formação do professor é também pensar a formação da pessoa do professor. Significa compreender os processos a partir dos quais esses profissionais passam a se constituir como sujeitos sociais da construção de uma proposta de educação. Ser professor não é apenas ser um mediador entre o aluno e o conhecimento já construído socialmente. Ser professor é ser agente do processo de construção do conhecimento que leva à formação de sua personalidade e a dos alunos envolvidos nessa relação. Tal formação exige um compromisso constante de pensar as práticas educativas para que sejam formativas dos sujeitos. O grande desafio na formação do professor é, pois, entendê-lo para poder prepará-lo para assumir sua condição de sujeito de saber que deve atuar em sala de aula.
O interesse pela temática da formação do professor no que concerne sua formação pessoal, neste trabalho, é o de desenvolver recursos de personalidade que permitam o enfrentamento das dificuldades encontradas na escola, sobretudo no que diz respeito ao conhecimento de si mesmo, de sua história pessoal, de suas lembranças de quando era criança e de seus afetos. Muitos são os trabalhos nesta área a salientar que o ato de ensinar não é apenas um simples gesto técnico com o qual o professor poderia ter um controle perfeito de tudo aquilo acontece em sala de aula (CIFALI, 2007).
O lugar da sala de aula constitui um encontro de vários sujeitos com múltiplas ocasiões de transferência. A relação entre o sujeito do inconsciente e o sujeito social deve ser tratada a partir de diferentes abordagens complementares (Psicologia, Psicanálise, Antropologia) que permitam a elaboração de uma real articulação entre um pensamento crítico e a ação profissional. É preciso, portanto, construir espaços de escuta que possibilitem o desvelamento do inconsciente dos sujeitos envolvidos na relação professor-aluno. A escuta clínica pode permitir a tomada de consciência e o deslocamento psíquico na subjetividade profissional que tem efeitos de diminuição de angústia. Por isso, acreditamos ser necessário desenvolver subsídios para uma formação do professor que lhe permita criar uma prática pedagógica que atenda suas necessidades e as dos alunos como sujeitos em desenvolvimento.

Formação do professor
O tema da formação do professor tem ocupado lugar de destaque nas pesquisas desenvolvidas na área de educação. As discussões a respeito desse tema versam sobre a tentativa de buscar soluções para os problemas que assolam a escolaridade básica brasileira. Muitas vezes, procura-se encontrar um fator que seja a causa dessa situação, achando-se que, solucionando o mesmo, o problema estará sanado. A visão tem sido de que há um mal e que, uma vez diagnosticado, há a possibilidade de uma solução (PEDROZA, 2003).
Não se trata de identificar, ou mesmo isolar uma causa. Os problemas encontrados na educação decorrem de vários fatores inter-relacionados numa complexidade que vai além dos detectados pela academia. Muitas vezes o professor tem sido apontado como o responsável pelas mazelas do fracasso escolar e muito tem sido proposto para alterar essa situação. No entanto, acreditamos que a qualidade da educação depende necessariamente da qualidade do professor.
A formação docente, além de estar ligada aos aspectos científicos e epistemológicos, também é um problema político, à medida que os professores são formados para atuar em uma escola que por sua vez exerce determinadas funções na sociedade. Também se torna um problema filosófico, uma vez que toda educação e toda formação de educadores remetem a um determinado conceito de ser humano e das suas relações com o mundo (ESTRELA, 2002).
As pesquisas na área de formação de professores têm se voltado para a promoção de mudança na prática pedagógica a partir da indagação sobre a natureza do trabalho docente (BOLÍVAR, 2002; ALMEIDA, 2006; AGUIAR e ALMEIDA, 2008). Enfatizam-se idéias e práticas de uma formação reflexiva do professor visando uma compreensão do significado de sua atividade pedagógica. Há uma preocupação em construir novas relações de trabalho na escola, em aprofundar o estudo teórico-metodológico e criar uma unidade entre teoria e prática, valorizando-se mais as experiências do professor e do trabalho coletivo.
Os trabalhos também indicam o interesse da formação de um profissional comprometido e responsável no que diz respeito ao acadêmico e ao pessoal. Um profissional capaz de dar conta de sua realidade com a finalidade de transformá-la, a partir de processos avaliativos de sua ação. Tal formação implica uma mudança de atitude diante da realidade e uma maneira diferente de perceber e atuar no mundo. É preciso levar em consideração as relações sociais que pressionam e perpassam o cotidiano escolar e se concretizam na prática pedagógica, influenciando na forma como os professores atuam na escola. A prática pedagógica é permeada por jogos de poder que muitas vezes fazem da sala de aula um espaço de cumprimento de ordens, de disciplina, e deixa de ser o espaço de produção de conhecimentos e de formação de sujeitos (NÓVOA, 1999; IMBERT, 2003; PRIOSTE, 2006).
Uma coletânea de artigos assinados por influentes pensadores na questão da formação que destacam o professor como profissional reflexivo foi reunida por Nóvoa (1992) em seu livro Os professores e a sua formação. Segundo esse autor, a formação de professores tem ignorado o desenvolvimento pessoal, confundindo "formar" e "formar-se". A lógica da atividade educativa nem sempre coincide com as dinâmicas próprias da formação que deixa de ter como eixo de referência o desenvolvimento profissional dos professores, tanto da perspectiva individual como da coletiva.
A formação do professor foi sempre influenciada pela abordagem da ciência positivista que tem se mostrado simplista e limitada para a prática social e para a ação do profissional que é chamado a enfrentar problemas de grande complexidade e incertezas no cenário escolar. A dimensão técnica da ação pedagógica reduziu a profissão docente a um conjunto de competências e de capacidades (PEDROZA, 2003).
Os professores têm enfrentado grandes dificuldades no sistema educacional principalmente quando se deparam com o surgimento de novos programas e currículos. As novas exigências requerem tempo para uma adaptação e acentuam as pressões institucionais, políticas e pedagógicas (CURI, 2007).
A partir dos anos 80, de acordo com Nóvoa (1995), a literatura pedagógica foi invadida por estudos sobre a vida dos professores, as carreiras e os percursos profissionais, as biografias e autobiografias docentes e o desenvolvimento pessoal dos professores. Esses estudos recolocam os professores no centro dos debates educativos e das problemáticas da pesquisa. Eles ajudam na compreensão da situação em que se encontram os docentes e, desse modo, podem propor ações de formação condizentes com suas necessidades. A utilização das abordagens biográficas dá voz aos próprios professores através de suas "histórias de vida". É importante que se escute a pessoa a quem se destina a formação.
A importância da prática reflexiva e de outros estudos na escola está ligada à necessidade da criação de um espaço onde o professor possa ser ouvido. Um espaço onde encontre um apoio para realizar essa reflexão. Não somos conscientes de todos os nossos atos e precisamos de um outro que nos faça ver nossas ações. A reflexão que propomos não é a mesma que cada pessoa realiza de modo espontâneo sobre sua prática. A proposta é de uma análise metódica para tomada de consciência de conteúdos do inconsciente que se interpõem na prática pedagógica.
A partir de grupos de discussão é possível realizar uma análise dos nossos atos e, coletivamente, pensar estratégias de soluções para os problemas que envolvem a prática pedagógica. Nesse sentido, faz-se necessário uma escuta clínica para assegurar aos professores uma ajuda, pois que não é fácil admitir nossas falhas, nossas angústias e medo de perder o respeito dos outros ao nos depararmos com a realidade de um desempenho "ruim". É preciso conduzir um procedimento clínico que seja capaz de desenvolver uma análise de práticas evitando receios de magoar colegas ou formas grosseiras. O professor deve estar seguro da sua prática e de si mesmo, como educador e adulto, para que, ao se sentir ameaçado não ameace, e possa ocupar o lugar de autoridade, de detentor do conhecimento e, nesta condição, ser reconhecido pelo aluno (PEDROZA, 1993; ALMEIDA, 2003; CIFALI, 2001).

A Psicanálise e a formação do professor
Desde a proposta de Freud de fazer da Psicologia uma ciência natural, a contribuição da Psicanálise se dá com o estudo do comportamento em função da história individual, em termos de acontecer humano. Com Freud, um fato psicológico adquiriu movimento, integrou-se em um processo porque se relacionou com os outros fatos psicológicos da mesma pessoa, no plano atual e histórico. O que temos em Freud é a valorização da natureza ativa dos processos inconscientes, sua qualidade dinâmica, influenciando e modelando o pensamento e a ação conscientes (PEDROZA e ALMEIDA, 1994).
Encontra-se no texto de Freud, de 1913, Múltiplo interesse da Psicanálise, a apresentação da pedagogia como uma das ciências não psicológicas de interesse da Psicanálise. Essa contribuição está principalmente na descoberta dos desejos, dos produtos mentais e dos processos evolutivos da infância e fundamentalmente na importância dada à sexualidade em suas manifestações somáticas e anímicas. Com a Psicanálise, o sujeito retoma seu próprio discurso, torna-se autor de sua palavra e do seu desejo no confronto com a realidade. O sujeito é visto como um ser histórico, social e cultural, dotado de inconsciente e desejos que influenciam e modelam o pensamento e a ação conscientes. Sendo assim, em contraposição a outras propostas de formação de professor que se constituem praticamente em técnicas de intervenção da realidade, fornecendo um instrumental teórico e prático, visando principalmente à adaptação ao contexto da escola, surge a Psicanálise, através do seu conceito de inconsciente, como um saber transgressor ao ideal das ciências experimentais.
A tentativa de Anna Freud (1958) de aplicação da psicanálise à pedagogia é na contribuição de uma visão crítica das normas pedagógicas existentes, por ser a doutrina da pulsão. Ela amplia o conhecimento que o pedagogo tem do homem, aguçando seu entendimento sobre as relações complexas entre a criança e os adultos que a educam. A tarefa de uma professora baseada nos fatos revelados pela análise consistiria em achar um equilíbrio entre os extremos do consentimento das satisfações do indivíduo e a proibição da manifestação da pulsão. O que ela defendia era uma análise pedagógica.
A importância da escola para a criança faz com que todo seu cotidiano gire em função da mesma. Nesse sentido, é preciso destacar seu papel e o do professor para com a criança. A criança ao entrar na escola, transfere para a figura do professor o respeito e a veneração antes dirigidos ao pai, de maneira a tratá-lo como se fosse seu pai (FREUD, 1914). A transferência acontece de forma natural na relação educador-educando, assim como nas outras relações humanas.
É a partir da noção de transferência que podemos identificar o pensamento dinâmico em Freud (1912a), quando ele discute a possibilidade de evolução e mudança nos quadros clínicos. A transferência funciona como motor do tratamento permitindo, por meio da fala, a reorganização do modo de funcionamento psíquico. Num sentido mais amplo, o tratamento implica a concepção de uma direção de mudança de personalidade.
O educador baseado em idéias psicanalíticas tem que renunciar à atividade excessivamente programada, obsessivamente controlada. Ele pode, a partir da Psicanálise, obter uma ética, um modo de ver e de entender sua prática educativa. O que for ensinado será confrontado com a subjetividade de cada um, o que permitirá o pensamento renovador, a criação e a geração de novos conhecimentos (KUPFER, 1989; 2001; LEGNANI & ALMEIDA, 2002; PECHBERTY, 2003).
Tradicionalmente, a formação do professor passa por disciplinas curriculares que consideram a aprendizagem como um processo puramente consciente e como produto da inteligência, desenvolvendo apenas os componentes cognitivos do indivíduo, negligenciando ou negando os afetivos e desconsiderando os processos inconscientes. É preciso enfatizar a necessidade de uma formação que parta da própria experiência pedagógica, buscando-se uma análise dos conflitos em sala de aula. As relações entre professor e alunos envolvem aspectos do inconsciente que interferem no processo ensino-aprendizagem (CROISY, 2006; NETTER, 2006; BLANCHARD-LAVILLE & NADOT, 2000).
A contribuição da Psicanálise, cujas origens como teoria encontram-se na prática clínica, certamente não é a de uma aplicabilidade direta às situações educativas. No entanto, sua contribuição está na possibilidade de trazer ao consciente, a partir da análise das práticas educativas, conteúdos do inconsciente do professor de forma a elucidar o porquê de algumas ações em sala de aula. Portanto, a importância da Psicanálise na formação dos educadores não está no sentido de lhes proporcionar mais uma técnica pedagógica, desenvolvida a partir de uma teoria desvinculada da prática, mas, sim, de remeter-lhes a um constante questionamento sobre sua prática pedagógica e sua relação com o educando.
Se concebermos a aprendizagem acontecendo numa relação com o outro, é necessário cultivar nessa relação o respeito mútuo, o reconhecimento das necessidades, buscando a expressão dos desejos e encontrando prazer no processo ensino-aprendizagem. Não nos cabe, simplesmente, dizer ao professor como deve fazer sua prática. É necessário propiciar-lhe as condições para que ele desenvolva uma sensibilidade que lhe permita assumir, diante das situações educativas, todas as suas contradições, buscando a construção do novo. O professor não deve se anular como sujeito desejante ou impedir que o aluno deseje. O reconhecimento mútuo é que permitirá, ao professor, ensinar verdadeiramente e, ao aluno, desejar aprender e construir o saber.

Grupos clínicos de análise de práticas pedagógicas
Os grupos clínicos de análise das práticas docentes abordam a questão do cuidado e do terapêutico estabelecendo o grupo e a prática profissional como objetos de um trabalho psicanalítico possível. Segundo descrição feita por Pechberty (2007), os grupos têm lugar no estabelecimento de ensino, ou fora, no contexto de formação continuada ou pessoal. A abordagem clínica de orientação psicanalítica leva em consideração prioritariamente os processos psíquicos, na sua maioria inconscientes, nas situações profissionais estudadas além dos conceitos de transferência e realidade psíquica (BLANCHARD-LAVILLE, 2005).
Os grupos de análise apresentados neste trabalho se caracterizam pela influência dos grupos criados por M. Balint, psicanalista médico que nos anos 1950, em Londres, aplicou no campo do trabalho social um dispositivo de formação de médicos generalistas (BALINT, 1996). O grupo clínico Balint é o exemplo mais característico de orientação psicanalítica sobre as práticas de educadores. Constitui-se em um dispositivo clínico que reúne profissionais de uma mesma categoria, com um coordenador, analisado ou analista que conduzirá a reflexão no grupo. Nesse quadro clínico preciso, cada participante apresenta um relato sobre um momento de sua prática pedagógica conflitante ao qual o grupo vai reagir. Esse relato pode dizer respeito à relação com um aluno, com a classe ou com a instituição e deve seguir o propósito metodológico da associação livre.
As situações trazidas remetem-se ao íntimo de cada um. Os desvios psíquicos que emergem abrem para falas e sentidos inesperados e afetos passados e presentes. Cada um se reconhece de modo diferente a partir do que emergiu do inconsciente graças ao "espelho" do grupo. O relato profissional e a palavra pessoal tornam-se significantes de outra realidade psíquica que se repete e age na experiência da classe, das atitudes e decisões tomadas no cotidiano. Ao falar sobre sua prática pedagógica esta se torna concreta diferenciando-se daquela que a pessoa desejaria ter e que por diferentes razões desconhece porque não faz.
O papel do coordenador do grupo é de identificar no discurso dos participantes os significantes específicos utilizados, os lapsos, as associações pessoais de cada um, nos limites de sua própria escuta, com a esperança de abrir ao outro possibilidades de novos sentidos. Ele não ensina e nem dá opiniões porque não há uma verdade a ser alcançada. Os participantes do grupo são vistos como seres autônomos que farão suas próprias análises com a ajuda do coordenador e o conjunto do grupo. A atitude do coordenador é deliberadamente e sistematicamente empática e calorosa por levar em consideração a dimensão de culpabilidade e de perseguição dentro da instituição escolar. As palavras do discurso são entendidas no nível dos efeitos que elas produzem e não a partir do sentido propriamente do que veiculam.

Considerações finais
A análise das práticas educativas de base psicanalítica ajuda a reflexão e permite ao professor que ele faça suas escolhas de atuação em sala de aula. Apesar de partir de um posicionamento teórico, a análise feita no grupo não impõe a aplicação de uma determinada teoria na prática do professor. Ela apenas possibilita a reflexão e a conscientização do porquê de uma determinada prática, que corresponderia a uma teoria ou a um fazer imposto por um imaginário. Da mesma forma, o coordenador também se apóia em saberes teóricos, saberes de referência que guiam o processo de análise, assim como o domínio de sua concepção de sujeito, da realidade psicológica e institucional.
No entanto, o que está realmente em jogo, e é a própria finalidade da análise das práticas, é o saber fazer e não o saber teórico de cada um do grupo. O grupo passa a ser um lugar de transformação da queixa uma vez que o professor pode falar sem medo de julgamentos e conta com a compreensão que a psicanálise oferece. O objetivo do grupo Balint não é solucionar de imediato os problemas dos professores, mas fazer com que possam discernir o que é concreto na relação educativa daquilo que lhe faz sofrer psiquicamente. No entanto, o autor ressalta que esses grupos não tratam da história singular de cada um, mas da sua posição profissional e as ressonâncias pessoais em jogo nos grupos.
O trabalho é terapêutico no sentido do acompanhamento clínico e na noção de terapia profissional visando à tomada de consciência e de deslocamento psíquico na subjetividade profissional que tem efeitos de diminuição da angústia. Segundo Pecheberty (2007), na relação professor-aluno, o conflito psíquico está presente em cada um e incide sobre o desvio entre o ideal e a realidade, e recobre experiências diferentes de dissociação ou de ligação entre o si-docente de hoje e o si-aluno inconsciente sempre ativo. Os grupos clínicos elaboram os traços do aluno imaginário que cada um foi e, eventualmente, fragmentos da história familiar que fazem laço com a situação profissional presente.
A Psicanálise por ser uma teoria que privilegia a escuta da palavra e da relação do sujeito com o saber tem em comum com a educação a preocupação da pessoa na sua singularidade, uma vez que provoca investimentos e emoções que permitem análises. A Psicanálise nos inspira antes de tudo um método de trabalho que exige que se faça um permanente retorno a si mesmo. Torna-se mais fácil ao professor de compreender sua prática pedagógica quando ele pode ser escutado por alguém de fora da situação pedagógica. No grupo de análise é possível uma modificação mesmo que limitada, mas extremamente importante da personalidade do professor que permite entender a relação com seus alunos em sala de aula (BALINT, 1996).

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An 7 Col. LEPSI IP/FE-USP 2009


Desafios na formação clínica de professores: entre o cuidado, o ensino e a transmissão


Sandra Francesca Conte de Almeida
Universidade Católica de Brasília


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RESUMO
A vida pessoal e a vida profissional do professor se imbricam mutuamente e determinam seus modos de ser e de estar na profissão. Ou, como afirma Nóvoa (2000, p.17), "é impossível separar o eu profissional do eu pessoal". Se considerarmos estas premissas como sendo verdadeiras e pertinentes, a formação de professores não pode estar centrada apenas nos aspectos técnicos, didáticos, instrumentais e racionais ligados ao exercício de um saber-fazer profissional. Ela demanda, ao contrário, ser orientada por um princípio ético capaz de sustentar o professor na incômoda posição daquele que exerce, conforme apontado por Freud (1925), um métier impossível.
Palavras-chave: formação, clínica, cuidado, ensino, transmissão.
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A vida pessoal e a vida profissional do professor se imbricam mutuamente e determinam seus modos de ser e de estar na profissão. Ou, como afirma Nóvoa (2000, p.17), "é impossível separar o eu profissional do eu pessoal". Se considerarmos estas premissas como sendo verdadeiras e pertinentes, a formação de professores não pode estar centrada apenas nos aspectos técnicos, didáticos, instrumentais e racionais ligados ao exercício de um saber-fazer profissional. Ela demanda, ao contrário, ser orientada por um princípio ético capaz de sustentar o professor na incômoda posição daquele que exerce, conforme apontado por Freud (1925), um métier impossível
A formação de professores exige, nesta perspectiva, que se considere o outro lado da questão, ou seja, o avesso da qualificação profissional focada no desenvolvimento de competências teórico-práticas, via de regra presentes na formação dos chamados "especialistas" da educação (notadamente orientadores educacionais, supervisores pedagógicos, psicólogos escolares, psicopedagogos) e também nos diversos cursos de "especialização" destinados à "capacitação" de professores do ensino fundamental e médio.
Neste sentido, os desafios que se apresentam ao cenário da formação de professores, dizem respeito, sobretudo, às dificuldades, resistências, impasses e condições relativos à implementação e à sustentação, no âmbito do processo formativo, de ações de cuidado, de ensino e de transmissão que, articuladas entre si, sejam capazes de colocar no centro do processo questões afeitas à subjetividade do professor, aos fenômenos inconscientes das relações transferenciais, aos conflitos oriundos dos processos grupais e a toda sorte de situação que toca, de forma inesperada e inusitada, o processo relacional do ensinar-aprender.
O desafio principal posto em discussão, aqui, refere-se, fundamentalmente, ao manejo de dispositivos de formação que levem em conta os limites e as possibilidades de ação/atuação de uma profissão cujo exercício faz apelo permanente à subjetividade do professor. A perspectiva de formação a que nos referimos é, nesta concepção, orientada por uma ética e não por uma técnica; é, ao mesmo tempo, pessoal e profissional, na medida em que essas dimensões se enlaçam mutuamente; e é, ainda, balizada pelo desejo e não pelo gozo, constituindo-se em um estilo singular e criativo de ensino e de transmissão no campo da formação de professores. Os dispositivos de formação passíveis de atender a essas finalidades são clínicos, no sentido do ethos do cuidado e do acolhimento, e se apóiam na compreensão de que o professor-sujeito se constitui, dinâmica e dialeticamente, como efeito de uma configuração subjetiva e de relações interpessoais e sociais tecidas ao longo de sua história de vida pessoal e de sua trajetória profissional.
Em trabalhos anteriores (Almeida, 2003; Marinho-Araújo, Almeida, 2005), procuramos esclarecer o sentido e o uso do termo clínico aplicado à formação de professores, notadamente no que concerne ao manejo dos dispositivos clínico-éticos no contexto da formação inicial e/ou continuada. Retomaremos, rapidamente, as bases dessa concepção, ampliando-a a partir de estudos e pesquisas dedicados à abordagem clínica, de inspiração psicanalítica, na formação de professores.
Baïetto e Gadeau (2002) definem as principais características do que nomeiam enquadre clínico, aplicado à formação inicial de monitores para o manejo de grupos de professores no contexto da análise das práticas educativas, em uma abordagem clínica. Para os autores, a principal função do enquadre clínico é a de favorecer a passagem entre duas maneiras de se referir à sua prática: uma, técnica, "douta", apoiada no conhecimento, a outra mais despojada do saber do "perito", do expert, na qual o sujeito se engaja de modo diferente na sua maneira de dizer e de escutar. Para melhor compreender essa passagem, ou mudança de posição discursiva dos sujeitos, comentaremos algumas características essenciais do enquadre clínico, apontadas pelos autores:
a) trata-se, primeiramente, de um dispositivo grupal, que requer que todos os membros do grupo se vejam uns aos outros na sala onde se reúnem e isto supõe, então, uma disposição em círculo. Supõe, também, que quando uma pessoa intervém, ela se dirija ao grupo e não a uma outra pessoa, em particular;
b) o grupo é considerado como "auto-teorizante", isto é, capaz de produzir uma "teoria" por si mesmo, à qual poderá vir a renunciar quando uma via mais fecunda se apresentar;
c) o dispositivo procura dar um estatuto próprio à fala, ou seja, considera o ato de fala como essencial, raro, apreciável, a ser protegido: o caráter confidencial é, aqui, importante e cada um deve se sentir assegurado de que aquilo que ele diz não será utilizado em outro lugar; as pessoas devem se sentir respeitadas tanto no que elas são quanto no que elas dizem. Isto implica em uma certa qualidade da escuta e, portanto, no trabalho ativo do monitor para reduzir a alteração da escuta, como, por exemplo, os apartes, as manifestações infra-verbais, etc;
d) o enquadre clínico se define, também, por uma posição particular do monitor: esta posição se caracteriza pela renúncia a tudo que poderia vir a favorecer a ocupação de uma posição de "modelo" (transmissão de seus próprios valores, seus próprios saberes). Neste sentido, essa posição se opõe à do formador, na perspectiva da formação tradicional. No entanto, em virtude de sua posição privilegiada, o monitor é investido imaginariamente pelos membros do grupo como sendo portador de um saber. Assim, é fundamental que essa posição imaginária, que em si mesma é necessária ao trabalho de elaboração grupal, não seja confirmada no real, pelo monitor. Dito de outro modo, o monitor não pode ocupar o lugar de Sujeito-suposto-saber, como poderia ocorrer no caso de um dispositivo clássico de formação.
A abordagem clínica, de orientação psicanalítica, aplicada à educação e à formação de professores, tal como defendida e praticada por alguns pesquisadores (Cifali, 1998, 2001; Imbert, 1992, 1996; Beillerot, Blanchard-Laville, Mosconi, 1996; Blanchard-Laville, Fablet, 2000, 2001; Blanchard-Laville, Chaussecourte, Hatchuel, Pechberty, 2005; Blanchard-Laville, 2007; Pechberty, 2005, 2007), alguns destes presentes neste Colóquio, como Claudine Blanchard-Laville e Bernard Perchberty, visa, como objetivo principal, a análise das práticas profissionais, considerando a premissa essencial da articulação entre o profissional e o pessoal. Nesta concepção, a dimensão profissional é compreendida como estando ancorada na dimensão pessoal e, esta, por sua vez, é percebida como sendo afetada pelas condições de realização e de operacionalização da dimensão profissional, em seus aspectos organizacionais, institucionais e sociais.
Trata-se, então, na análise das práticas profissionais aplicada ao ofício docente, por meio de dispositivos clínico-éticos de formação, da análise da práxis de um sujeito em situação profissional e não da prática de uma profissão, em geral. Enquanto prática de um sujeito, esta se reporta a um conjunto de situações, de eventos e de experiências ancoradas na dinâmica psíquica própria do sujeito, compreendendo o processo de interação social entre o sujeito e seu contexto, a leitura que o sujeito faz da situação, as decisões que ele toma e as percepções que tem sobre os efeitos e implicações das decisões por ele tomadas (Nadot, 2002).
Embora o enquadre seja clínico e a análise das práticas profissionais se reporte a um sujeito, em particular, no contexto de um grupo, é importante reafirmar que a finalidade desse dispositivo de formação não é terapêutica, na acepção clássica do termo, isto é, a direção visada não é a "cura" do professor, por meio da interpretação de sintomas e atos, mesmo que relacionados ao mal-estar docente. No entanto, o cuidado, o ensino e a transmissão são registros que permeiam o dispositivo e que se articulam por meio da relação indissociável entre a teoria psicanalítica e a sua aplicação, no campo das práticas profissionais. O objetivo principal deve ser o trabalho de reflexão e de pesquisa sobre as dimensões subjetivas, psicossociais, institucionais e relacionais que constituem a realidade material e psíquica na qual acontecem as práticas educativas, incluindo aí, obviamente, a dimensão inconsciente do professor-sujeito. Cabe lembrar, então, em relação ao dispositivo clínico, o perigo de duas situações que devem ser evitadas: de um lado, a tendência à interpretação "selvagem" e, de outro, a tendência às prescrições, as conhecidas "receitas" pedagógicas.
O enquadre clínico, tal como caracterizado anteriormente, aplicado à análise das práticas profissionais, no contexto da formação de professores, propicia a (re)construção, em contexto, da identidade profissional do professor e a ressignificação de suas práticas, por meio de dispositivos que contemplam a colocação, em ato, de processos intra-subjetivos e inter-subjetivos que atravessam o ofício docente. Ao mesmo tempo, permitem a elaboração reflexiva sobre os aspectos imprevisíveis e as zonas de sombra presentes em toda situação educativa, o estabelecimento de uma nova relação com o saber e com a alteridade e a criação de um estilo próprio, singular, marcado pelos traços de desejo do sujeito. Estes recursos, que exigem um trabalho pessoal a ser desenvolvido no coletivo, são difíceis, mas não são impossíveis de serem apropriados pelos professores e poderão ajudá-los a minimizar o impacto e os efeitos, pessoais e profissionais, do confronto com o real da educação, cujo cerne consiste na impossibilidade de um sucesso total do ato educativo.
Assim compreendido, o uso de dispositivos clínicos na formação de professores só faz sentido se focalizar a dimensão da subjetividade e o campo das relações interpessoais, presentes nas práticas docentes. Deste modo, expressões e registros psíquicos de diversas ordens, afeitos ao campo relacional e profissional, estarão no centro da análise e das intervenções, o que supõe a circulação de ações de cuidado, de ensino e de transmissão no interior do dispositivo, a cargo, sobretudo, de quem sustenta o processo: o mediador, o animador, o monitor, o pesquisador, o analista, o formador, conforme as diferentes designações (e sentidos) atribuídas àquele(a) que coordena a intervenção.
Se considerarmos, ainda, que o dispositivo clínico é grupal, que visa possibilitar a produção de uma teoria, a partir da reflexão sobre as práticas, que as análises, as reflexões e as confrontações, no âmbito do grupo, têm como instrumento privilegiado os atos de fala e a atitude clínica da escuta, que requer do animador uma posição clínica particular e uma relação específica com o saber, podemos deduzir, facilmente, os desafios e, mesmo, os impasses que uma proposta dessa natureza nos apresenta, no contexto da formação de professores, na realidade brasileira.
A pergunta que, na origem de nossa reflexão, mobilizou a produção desse texto, tem a ver com a formação – pessoal e profissional - daquele que se dispõe a coordenar, a animar e a mediar o enquadre clínico na formação de professores, por meio de dispositivos que privilegiam a atitude clínica, ou uma posição clínica particular, que compreende o fazer-falar o outro e a escuta sensível dessa fala, esse outro tomado na condição de sujeito em uma dada situação profissional. Essa questão nos remete, de imediato, ao campo da ética e do desejo, pois convoca o animador e os participantes do processo de formação a um encontro delicado, cujos efeitos subjetivos podem surpreender, posto que o inconsciente dos sujeitos, em relação, subverte a ordem, as aparências e as intenções estabelecidas, já que não se deixa capturar pelo controle da razão.
Pensar a formação do animador ou do mediador, na perspectiva da formação clínica, sobretudo de orientação psicanalítica, no campo das práticas docentes, leva-nos, necessariamente, a interrogar o campo da formação profissional dos "psi" e dos pedagogos e a articulação entre a psicanálise e a educação, enquanto saber e prática diferenciados. Ser psicólogo ou ser pedagogo credenciaria automaticamente o profissional a intervir no campo da formação de professores, na abordagem aqui definida e defendida? Desses profissionais, qual teria, em princípio, melhores condições e recursos, pessoais e profissionais, de sustentar um trabalho dessa natureza? Perguntas dessa ordem, obviamente, para além do mal-estar que provocam, têm origem em velhas polêmicas e antigas disputas e recriminações (algumas até com um certo fundamento teórico-epistemológico), que sempre alimentaram as relações entre o campo das práticas psicológicas e o das práticas pedagógicas. No que concerne especificamente à psicanálise, não é necessário lembrarmos, aqui, as discussões calorosas e as posições contrárias ou favoráveis às conexões entre a psicanálise e a educação, por parte de psicanalistas e educadores.
Parece evidente que o fato de ser psicólogo (clínico ou escolar) ou pedagogo não garante a implicação do desejo do sujeito na empreitada do projeto de formação e, muito menos, lhe assegura sustentar a posição discursiva e ética de um Outro barrado, capaz de manejar ações de cuidado, de ensino e de transmissão que venham a operar mudanças significativas nas relações do professor com o saber e com suas práticas educativas.
No entanto, parece óbvio, também, que se espera do profissional que seja atravessado, afetado, de um modo particular, pela psicanálise, e que tenha experiências suficientes no campo da educação para que consiga manejar, a partir de uma posição discursiva clínica, as diversas e diferentes situações subjetivas e profissionais que surgirão na esteira do dispositivo de formação.
A análise das práticas profissionais, sobretudo na perspectiva da formação clínica, de inspiração psicanalítica, se revela, portanto, bastante complexa: pressupõe o acolhimento de diversas demandas e motivações; exige a elucidação de significações e sentidos dos diferentes contextos e problemas que se apresentam; coloca em evidência que o ofício de professor, principalmente por se ocupar da infância e da adolescência e ser de natureza relacional, põe em jogo as dimensões afetivas, conscientes e inconscientes, dos sujeitos em relação; mobiliza a rememoração e narrativas de situações difíceis e conflitivas, a auto-confrontação e a confrontação de diferentes pontos de vista, entre pares, e seus remanejamentos, suscita ou reativa tensões, ansiedades, conflitos, rivalidades, fantasmas de reparação, de culpabilidade, de "acerto de contas", mobilizando angústia, defesas psíquicas, movimentos transferenciais e contratransferenciais, inconscientes, do professor-sujeito.
O enquadre clínico de formação, nesta perspectiva, por se constituir em um espaço psíquico privilegiado de fala e de escuta de sujeitos em situação profissional, exige do animador do dispositivo uma postura particular, uma posição discursiva analítica, mesmo que sua formação inicial não tenha origem no campo "psi".
Já temos elementos suficientes para avançar a hipótese de que aquele que se autoriza a coordenar, a animar, a dar suporte à formação de professores, na perspectiva clínica, notadamente de filiação psicanalítica, terá melhores condições e recursos subjetivos de exercer essa função, se apoiado em um desejo "decantado" pela experiência pessoal de análise, ou seja, pela psicanálise em intensão, retomando o neologismo empregado por Lacan (1975) ao se referir à transmissão da psicanálise na formação do analista.
Os desafios que se nos apresentam, então, no campo formativo, na abordagem aqui apresentada, nos convocam, psicanalistas, sobretudo, psicólogos, pedagogos e outros profissionais das ciências humanas e do campo educacional, à responsabilidade de assumir um compromisso ético com a formação profissional dos professores, de modo a garantir, minimamente, que as dimensões do cuidado, do ensino e da transmissão sejam preservadas no interior do dispositivo. O desejo e a ética a que nos referimos, atravessados pela experiência da análise pessoal, na formação do analista, apontam para a verdade subjetiva do sujeito, revelando o seu estilo singular e também "os modos pelos quais, intra e intersubjetivamente, regula a tensão entre prazer e gozo, fantasia e realidade, pulsão e desejo, ou seja, dá testemunho de como obtura a falta no Outro" (Almeida, 2006, p. 15). Se o estilo, em Lacan (1966), tem a ver com o inconsciente enquanto discurso do Outro e com o objeto a, objeto causa do desejo, será o estilo do sujeito, enquanto efeito da experiência de análise, efeito, portanto, do ensino e da transmissão da psicanálise e de sua ética, que o credenciará a ocupar um lugar privilegiado no dispositivo clínico de formação de professores.

Referências Bibliográficas
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segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Resenha

Hiperatividade: o "não-decidido" da estrutura ou o "infantil" ainda no tempo da infância

Almeida, S.F.C. Doutora em Ciências da Educação (Psicologia) e diplomada em Psicologia Escolar pela Université René Descartes, Paris V, Sorbone. Psicanalista. Membro Fundador de Percurso Psicanalítico de Brasília. Tem vários livros publicados

Obra resenhada por Leide

O texto traz a tona um dos problemas mais vexatório em nossos dias, a hiperatividade. A autora coloca que atualmente existe um aumento expressivo do diagnóstico de Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDA/H), nos contextos de escolarização tendo em vista um discurso normativo e nostálgico, onde a autoridade paterna e os limites não são mais claramente definidos. Por sua vez, o discurso médico contemporâneo, também advindo da psiquiatria biológica, se prende às noções de déficit, incapacidade, insuficiência e atém-se às disfunções da atenção, motricidade e aos problemas da esfera relacional para diagnosticar o TDA/H.
Menciona que no DSM IV as disfunções da criança, tem as mesmas disfunções descritas no TDA/H em diferentes estruturas clínicas e posições subjetivas, como na psicose, autismo ou na debilidade intelectual. Essa lógica diagnóstica, enfatiza a função/disfunção, ignorando o sujeito, podendo dessa forma, diagnosticar a agitação psicomotora de uma criança psicótica como sendo transtorno de hiperatividade.
Em seu artigo, a autora escreve que há adesão maciça da prática médica à lógica curativa e, se respalda na concepção de que haveria efeitos benéficos da terapêutica medicamentosa para os portadores de TDA/H, uma vez que estes se sentiriam mais calmos e com maior autocontrole. Porém, há posição contrária a esta argumentação, alguns autores fazem sérias críticas a essa prática, destacando que a prevalência da postura terapêutica poderia encobrir problemas de ordem emocional do sujeito ou problemas ocasionados por situações sociais adversas (Graeff, 1989).
Tendo como parâmetro a psicanálise, o caminho mais prudente a adotar se pauta no entendimento de que a ordem simbólica, na qual os discursos sociais se inscrevem, cria possibilidades para o funcionamento de certas regularidades psíquicas e não de outras. A análise da relação sujeito/cultura permite uma reflexão acerca da problemática do TDA/H, na qual são consideradas as dimensões do sujeito e do social.
Segundo a autora, do ponto de vista da psicanálise, as funções psicológicas - inteligência, percepção, fala e motricidade, dentre outras - articulam-se entre si e são efeitos da configuração subjetiva do sujeito que, por sua vez, se constitui a partir dos significantes do Outro. A avaliação diagnóstica ancorada na teoria psicanalítica deve se ater à noção de estrutura, como se dá a inscrição do sujeito no discurso, tendo em vista que esses dois eixos implicam a subjetividade do analista em sua escuta e não possibilitam certezas, apenas hipóteses de trabalho
Na realidade as crianças com o diagnóstico médico de TDA/H aponta para uma organização estrutural indefinida, que esbarra nas delimitações das estruturas clínicas - neurose, psicose, perversão - sinalizando para uma posição subjetiva que está na borda, no limite das referidas estruturas. As manifestações sintomáticas do TDAH aponta para os efeitos do infantil, ainda não esquecido, não ainda recalcado.
A diferença que se faz presente nessas crianças aponta para uma indefinição do tipo de negativa essencial ao funcionamento psíquico. Neste caso, o não-decidido se manifesta pela ausência do não que não foi incorporado pela criança para coibir o desejo do Outro. Um não que seria capaz de lhe possibilitar uma organização psíquica outra e uma significação mais efetiva de si mesma e do mundo, a partir do referente simbólico.
Para explicitar seu artigo a autora busca na fala de Rassial (2000, 1997a, 1997b, 1995) que postula que não se pode falar em estado-limite na infância, por ser este, sobretudo, o resultado de uma operação a ser feita no tempo da adolescência. Não obstante, pode-se supor e acompanhar os investimentos narcísicos nas operações lógicas constitutivas da imagem do corpo e do pensamento que precederam essa fase e articulá-los às vicissitudes e dificuldades localizadas nas duas operações de constituição do eu: na formação do eu-ideal, na qual a função materna teria um papel relevante, e na instância do ideal-do-eu, resultante da Lei paterna.
A autora coloca que a problemática do TDA/H pode ser pensada como uma manifestação do infantil ainda no tempo de infância e que, ao se mostrar durante o processo de escolarização, é facilmente capturada pelo discurso e diagnóstico médicos face aos inúmeros encaminhamentos que o sistema escolar faz, na atualidade, ao se deparar com as "difíceis" crianças avaliadas como turbulentas e desatentas.
Em fim, para ilustrar o artigo e levar o leitor a uma reflexão mais profunda, a autora relatou em fragmentos clínicos um estudo de caso de uma criança diagnosticada como "portadora" de TDA/H. na rede pública do DF, sem levar em conta a subjetividade e que, o acesso a essa posição subjetiva possibilitaria à criança, na idade escolar, engajar-se na socialização e organizar o pensamento e as aprendizagens. Todavia, essa operação psíquica implica em uma divisão, a qual fará com que, a criança lide com constantes autocensuras e culpa em virtude das contradições impostas ao eu pelo desejo inconsciente agora esquecido.
Apreciação Crítica.
Dentro de contexto escolar, acontece com freqüência a queixa de professor com a fala “não aguento mais aquele garoto.... se a mãe dele não vier conversar comigo ele não entra na minha sala... ele é hiperativo e a mãe não procura um tratamento”. O TDAH é com freqüência apresentado do ponto de vista “meu” na sua grande maioria erroneamente, como um tipo específico de problema de aprendizagem e não é. Crianças com TDAH não são incapazes de aprender, mas têm dificuldade na escola por causa da falta de organização, de atenção e da impulsividade, Diante desses sintomas, a criança é levada a equipe denominada de multidisciplinar ( pedagogo, psicopedagogo, orientadora educacional e psicólogo) para fazer uma avaliação e posterior, ser encaminhada para um neurologista e conseqüentemente, ser medicada sem passar por uma escuta clínica, não respeitando sua subjetividade. É preciso que esse diagnóstico seja de fato, feito com mais cuidado e de preferência, após a criança passar um período em tratamento terapêutico.
A autora faz uma crítica veemente a prática desse discurso do diagnostico ao TDAH sem analisar os efeitos das relações sujeito/família, sujeito/escola, sujeito social e cultural na posição subjetiva da criança.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

INCONSCIENTE

Sigmund Freud foi um intelectual que aliava a parte teórica à prática. Escritor compulsivo e extremamente produtivo, foi colocando suas teorias num estilo próprio e característico, em estilo científico, mas sem exagerar nas citações a outros pensadores e cientistas.
FREUD, Sigmund. Obras Completas Psicológicas de Sigmund Freud. Edição
Standard Brasileira. Rio de Janeiro: Imago, 1980.


Obra resenhada por Leide

Podemos afirmar, da existência de um estado psíquico inconsciente, quando em um dado momento qualquer, o conteúdo da consciência é muito pequeno, de modo que a maior parte do que chamamos conhecimento consciente deve permanecer, por consideráveis períodos de tempo, num estado de latência, isto é, deve estar psiquicamente inconsciente. Quando todas as nossas lembranças latentes são levadas em consideração, fica totalmente incompreensível que a existência do inconsciente possa ser negada.
A resposta óbvia a isso é a de que uma lembrança latente é, pelo contrário, um resíduo inquestionável de um processo psíquico.
O autor vem justificar o conceito de INCONSCIENTE como um direito de supor a existência de algo mental inconsciente, e de empregar tal suposição visando às finalidades do trabalho científico, que tem sido vastamente contestado. Para ele, responder que a suposição a respeito do inconsciente, é necessária e legítima, e que dispõe de numerosas provas de sua existência. Ele diz que é necessária porque os dados da consciência apresentam um número muito grande de lacunas; tanto nas pessoas sadias como nas doentes ocorrem com freqüência atos psíquicos que só podem ser explicados pela pressuposição de outros atos, para os quais, não obstante, a consciência não oferece qualquer prova. Na psicanálise, não tem outra opção senão afirmar que os processos mentais são inconscientes em si mesmos, e assemelhar a percepção deles por meio da consciência
percepção do mundo externo por meio dos órgãos sensoriais.Assim o autor do artigo nos passa que: a repressão não visa a destruição da idéia que representa um instinto, mas evitar que se torne consciente; Enquanto inconsciente, pode produzir efeitos, até mesmo atingir a consciência; o reprimido não abrange tudo o que é inconsciente ; só tomamos conhecimento de algo inconsciente através da tradução para algo consciente e que o trabalho psicanalítico, que lida com as resistências
O inconsciente abrange, por um lado, atos que são meramente latentes, temporariamente inconscientes, mas que em nenhum outro aspecto diferem dos atos conscientes, e, por outro lado, abrange processos tais como os reprimidos, que, caso se tornassem conscientes, estariam propensos a sobressair num contraste mais grosseiro com o restante dos processos conscientes.
As descobertas positivas da psicanálise, pode-se dizer que, em geral, um ato psíquico passa por duas fases quanto a seu estado, entre as quais se interpõe uma espécie de teste (censura). Na primeira fase, o ato psíquico é inconsciente e pertence ao sistema Ics; se, no teste, for rejeitado pela censura, não terá permissão para passar à segunda fase; diz-se então que foi ‘reprimido’, devendo permanecer inconsciente. Se, porém, passar por esse teste, entrará na segunda fase e, subseqüentemente, pertencerá ao segundo sistema, que chamaremos de sistema Cs. Em vista dessa capacidade de se tornar consciente, denomina o sistema Cs. de ‘pré-consciente’. Por ora o autor diz que se contenta em ter em mente que o sistema Pcs. participe das características do sistema Cs., e que a censura rigorosa exerca sua função no ponto de transição do Ics. para o Pcs. (ou Cs.)
Na topografia psíquica, no momento, nada tem que ver com a anatomia; refere-se não a localidades anatômicas, mas a regiões do mecanismo mental, onde quer que estejam situadas no corpo. A esse respeito, o autor coloca que seu trabalho fica desembaraçado, podendo prosseguir em função de suas próprias necessidades.Para tanto, ele vem lembrar que, no pé em que as coisasestão, as hipóteses nada mais exprimem do que ilustrações gráficas. A primeira das duas possibilidades que considera — isto é, que a fase Cs. de uma idéia acarreta um novo registroda idéia, situado em outro lugar —, é sem dúvida a mais grosseira, embora também mais conveniente. A segunda hipótese — a de uma mudança de estado meramente funcional — é àpriori mais provável, embora menos plástica, menos fácil de manipular. À primeira hipótese, a topográfica, está estreitamente vinculada a de uma separação topográfica dos sistemas Ics. e Cs. e também a possibilidade de que uma idéia possa existir simultaneamente em dois lugares no mecanismo mental — na realidade, a possibilidade de que, se não estiver inibida pela censura, ela avançará regularmente de uma posição para outra, sem perder talvez sua primeira localização ou registro.
Do ponto de vista do autor do artigo, um instinto nunca pode tornar-se objeto da consciência — só a idéia que o representa. Além disso, mesmo no inconsciente, um instinto não pode ser representado de outra forma a não ser por uma idéia. Se o instinto não se prendeu a uma idéia ou não se manifestou como um estado afetivo, nada se pode conhecer sobre ele. Não obstante, quando se fala de um impulso instintual inconsciente ou de um impulso instintual reprimido, a imprecisão da fraseologia é inofensiva. Pode apenas referir a um impulso instintual cuja representação ideacional é inconsciente, pois nada mais entra em consideração. Deve esperar que a resposta à questão dos SENTIMENTOS, EMOÇÕES E AFETOS INCONSCIENTES seja dada com igual facilidade. Por certo, faz parte da natureza de uma emoção que esteja cônscio dela, isto é, que ela se torne conhecida pela possibilidade do atributo da inconsciência seria completamente excluída no tocante às emoções,sentimentos e afetos.
Na prática psicanalítica, porém, está habituado a falar de amor, ódio, ira etc. inconscientes, e achar impossível evitar até mesmo a estranha conjunção ‘consciência inconsciente de culpa’, ou uma ‘ansiedade inconsciente’ paradoxal.
A importância do sistema Cs. (Pcs.) no que se refere ao acesso à liberação do afeto e à ação, permite-nos também compreender o papel desempenhado pelas idéias substitutivas na determinação da forma assumida pela doença. É possível ao desenvolvimento do afeto proceder
diretamente do sistema Ics.; nesse caso, o afeto sempre tem a natureza de ansiedade, pela qual
são trocados todos os afetos ‘reprimidos’. Com freqüência, contudo, o impulso instintual tem de
esperar até que encontre uma idéia substitutiva no sistema Cs. O desenvolvimento do afeto pode
então provir desse substituto consciente e a natureza desse substituto determina o caráter qualitativo do afeto.
Afirmamos que na repressão ocorre uma ruptura entre o afeto e a idéia à qual ele pertence, e que cada um deles então passa por vicissitudes isoladas. Descritivamente, isso é incontestável; na realidade, porém, o afeto, de modo geral, não se apresenta até que o irromper de uma nova apresentação no sistema Cs. tenha sido alcançado com êxito.

No que se refere a TOPOGRAFIA E DINÂMICA DA REPRESSÃO o autor chega à conclusão de que a repressão constitui essencialmente em fazer uma nova tentativa de descrever o processo com maiores detalhes. Segundo ele, deve tratar-se de uma retirada da catexia; mas a questão é: em que sistema ocorre a retirada e a que sistema pertence a catexia retirada? A idéia reprimida permanece capaz de agir no Ics., e deve, portanto, ter conservado sua catexia. O que foi retirado deve ter sido outra coisa. Tomemos o caso da repressão propriamente dita (‘pressão posterior’) quando afeta uma idéia pré-consciente ou mesmo consciente. Aqui, a repressão só pode consistir em retirar da idéia da catexia (pré) que pertence ao sistema Psc. A idéia portanto, ou permanece não catexizada, ou recebe a catexia do Ics., ou retém a catexia do Ics. que já possuía. Assim, há uma retirada da catexia pré-consciente, uma retenção de catexia inconsciente, ou uma substituição da catexia pré-inconsciente por uma inconsciente Mas esse processo de retirada da libido não é suficiente para tornar compreensível uma outra característica da repressão.
Na histeria da ansiedade, uma primeira fase do processo é comumente desprezada e talvez, de fato, passe despercebida; mediante detida observação, contudo, ela pode ser claramente discernida. Consiste no surgimento da ansiedade sem que o indivíduo saiba o que teme.— Na segunda fase da histeria de ansiedade, portanto, a anticatexia proveniente do sistema Cs. leva à formação do substituto. A cada aumento da excitação instintual, a muralha protetora em torno da idéia substitutiva deve ser deslocada um pouco mais para fora. À totalidade dessa construção, que é erigida de forma análoga nas demais neuroses, denominamos fobia. A fuga de uma catexia consciente da idéia substitutiva se manifesta nas evitações, nas renúncias e nas proibições, por meio das quais reconhecemos a histeria de ansiedade. Já na terceira fase repete o trabalho da segunda numa escala mais ampla. O sistema Cs. se defende agora da ativação da idéia substitutiva por meio de uma anticatexia do seu ambiente, da mesma maneira pela qual, anteriormente, se defendia da emergência da idéia reprimida por meio de uma catexia da idéia substitutiva. Desse modo, prossegue a formação de substitutos por deslocamento.
O ego comporta-se como se o perigo de um desenvolvimento da ansiedade o ameaçasse, não a partir da direção de um impulso instintual, mas da direção de uma percepção, tornando-se assim capaz de reagir contra esse perigo externo através das tentativas de fuga substitutiva na histeria de ansiedade. Dessa circunstância o autor conclui que a quantidade de energia despendida pelo sistema Cs.

Na repressão não precisa ser tão grande quanto a energia catexial do sintoma, pois a força da repressão é medida pela quantidade de anticatexia despendida, ao passo que o sintoma é sustentado não somente por essa anticatexia, como também pela catexia instintual oriunda do
sistema Ics. que se acha condensada no sintoma.
Quanto à neurose obsessiva, é preciso acrescentar é que a anticatexia proveniente do sistema Cs. se coloca da forma mais conspícua no primeiro plano. É isso que, organizado como uma formação de reação, provoca a primeira repressão, constituindo depois o ponto no qual a idéia reprimida irrompe. Dessa forma podemos aventurar a suposição de que é devido à predominância da anticatexia e à ausência de descarga que o trabalho de repressão parece muito menos bem-sucedido na histeria de ansiedade e na neurose obsessiva do que na histeria de conversão.
‘ Quanto as CARACTERÍSTICAS ESPECIAIS DO SISTEMA Ics. Segundo o autor, a distinção que se estabelece entre os dois sistemas psíquicos ganha novo significado quando os processos em um dos sistemas, o Ics., apresenta características que
não encontra no sistema imediatamente acima dele. O núcleo do Ics. consiste em representantes instintuais que procuram descarregar sua catexia em impulsos carregados de desejo que são coordenados entre si, e se influenciam mutuamente, e estão isentos de contradição mútua. Quando dois impulsos carregados de desejo, cujas finalidades são incompatíveis, se tornam simultaneamente ativos, um dos impulsos não reduz ou cancela o outro, mas os dois se combinam para formar uma finalidade intermediária, um meio termo.
Os processos do sistema Ics. são intemporais; isto é, não são ordenados temporalmente, não se alteram com a passagem do tempo; não têm absolutamente qualquer referência ao tempo, a referência ao tempo vincula-se, mais uma vez, ao trabalho do sistema Cs. a intemporalidade e a substituição da realidade externa pela psíquica — tais são as características que podemos esperar encontrar nos processos pertencentes ao sistema Ics.
Quando um processo passa de uma idéia para outra, a primeira idéia conserva uma parte de sua catexia e apenas uma pequena parcela é submetida a deslocamento. Os deslocamentos e as condensações, tais como ocorrem no processo primário, são excluídos ou bastante restringidos. Essa circunstância levou Breuer a presumir a existência de dois estados diferentes de energia catexial na vida mental: um em que a energia se acha tonicamente ‘vinculada’ e outro no qual é livremente móvel e pressiona no sentido da descarga. Para o autor a distinção representa a compreensão interna (insight) mais profunda que se alcançou até agora a respeito da natureza da energia nervosa,

Segundo o autor, a COMUNICAÇÃO ENTRE OS DOIS SISTEMS, seria não obstante errôneo imaginar que o Ics. permanece em repouso enquanto todo o trabalho da mente é realizado pelo Pcs. Para ele, é o contrário, o Ics. permanece vivo e capaz de desenvolvimento,mantendo grande número de outras relações com o Pcs., entre as quais a da cooperação. Ele aponta que, deve-se dizer que o Ics. continua naquilo que conhecemos como derivados, que é acessível às impressões da vida, que influencia constantemente o Pcs., e que, por sua vez, está inclusive sujeito à influência do Pcs.
Para o autor deste artigo, o Ics. é rechaçado, na fronteira do Pcs., pela censura, mas os derivados do Ics. podem contornar essa censura, atingir um alto grau de organização e alcançar certa intensidade de catexia no Pcs. Quando, contudo, essa intensidade é ultrapassada e eles tentam forçar sua passagem para a consciência, são reconhecidos como derivados do Ics. e outra vez reprimidos na fronteira da censura, entre o Pcs. e o Cs. Assim, a primeira dessas censuras é exercida contra o próprio Ics., e a segunda, contra os seus derivados do Pcs. Poder-se-ia supor que no decorrer do desenvolvimento individual a censura deu um passo à frente. No tratamento psicanalítico fica provada, sem sombra de dúvida, a existência da segunda censura, localizada entre os sistemas Pcs. e Cs. Pedimos ao paciente que forme numerosos derivados do Ics., fazemos com que ele se comprometa a superar as objeções da censura a essas formações pré-conscientes que se tornam conscientes, e, pondo abaixo essa censura, desbravamos o caminho para ab-rogação da repressão realizada pela anterior. A isso acrescentemos que a existência da censura entre o Pcs e o Cs. nos ensina que o tornar-se consciente não constitui um mero ato de percepção, sendo provavelmente também uma hipercatexia, um avanço ulterior na organização psíquica.
Os sistemas se comunicam entre si mais extensivamente. Uma parcela dos processos que lá são excitados passa através do Ics. e atinge o desenvolvimento psíquico mais elevado no Cs.; outra parcela é retida como Ics. Mas o Ics. é também afetado por experiências oriundas da percepção externa. O conteúdo do sistema Pcs. (ou Cs.) deriva em parte da vida instintual (por intermédio doIcs.) e em parte da percepção.
O autor afirma que os processos desse sistema podem exercer influência direta sobre o Ics.; o exame de casos patológicos muitas vezes revela uma incrível independência e uma falta de suscetibilidade à influência por parte do Ics. Uma completa divergência de suas tendências, uma total separação dos dois sistemas, é o que acima de tudo caracteriza uma condição de doença. O tratamento psicanalítico se baseia numa influência do Ics. a partir da direção do Cs., e pelo menos demonstra que, embora se trate de uma tarefa laboriosa, não é impossível. Os derivados do Ics. que agem como intermediários entre os dois sistemas desvendam o caminho, conforme já dissemos para que isso se realize.
Contudo, pode presumir com segurança segundo o autor que uma alteração espontaneamente efetuada no Ics. a partir da direção do Cs. constitui um processo difícil e lento.
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segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

PREFÁCIO A JUVENTUDE DESORIENTADA , DE AICHHORN

PREFÁCIO A JUVENTUDE DESORIENTADA , DE AICHHORN

Sigmund Freud foi um intelectual que aliava a parte teórica à prática. Escritor compulsivo e extremamente produtivo, foi colocando suas teorias num estilo próprio e característico, em estilo científico, mas sem exagerar nas citações a outros pensadores e cientistas.

S. Freud nasceu em 06 de maio de 1856 na Checoslováquia, de origem judaica. Aos 8 anos já lia Shakespeare e, na adolescência uma conferência, cujo tema era o ensaio de Goethe sobre a natureza ficou profundamente impressionado. Trocou a faculdade de Direito pela Medicina e interessou-se pela área de pesquisas. Iniciou seu trabalho sobre o sistema nervoso central, publicou vários artigos sobre cocaína. Especializou-se em doenças nervosas e criou interesse pela "histeria" e pela hipnoterapia praticada na época por Breuer Charcot. Os dois , trabalhando juntos publicaram "Estudos sobre a Histeria" e na mesma época Freud conseguiu analisar um sonho seu que ficou conhecido como "O Sonho da Injeção feita em Irma", rascunhou "Projeto para uma psicologia Científica" somente publicada após sua morte.O termo psicanálise (associação livre) , foi iniciado por ele após passar por um trauma com a morte de seu pai e começou com seu amigo WILHELM FLIESS .
"A Interpretação de Sonhos" que Freud considerava um de seus melhores livros foi publicado para ser projetado no inicio do novo século, XX. Foi bastante hostilizado por seus colegas médicos, trabalhando em total isolamento. Deu inicio a análise de Dora , sua paciente e escreveu Sobre a Psicopatologia da Vida Cotidiana, " publicando em 1901. Escreveu "Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade, "Os Chistes e sua relação com o Inconsciente, " "Fragmento da análise de um caso de Histeria"; (neurose) Teve alguns seguidores como Alfred Adler, Carl Jung, que depois separaram-se de Freud e criaram suas próprias escolas, discordando da ênfase que Freud dava à origem sexual da neurose.(nervosismo, irritabilidade, excitação) Durante a Segunda Guerra Mundial Freud foi para a Inglaterra, mas suas irmãs foram assassinadas em campos de concentração. Freud ainda escreveu "Conferências Introdutórias sobre Psicanálise e há vários volumes da "Coletânea das Obras de Sigmund Freud, que entre outros temas, abrangia a teoria do trauma do nascimento.
Freud é considerado o PAI DA PSICANÁLISE, onde o paciente, vai com ou sem hipnose, lembrando-se de seus traumas, durante a vida e libertando-se de seus sofrimentos e atitudes de irritabilidade, histeria etc....É muito utilizado hoje em dia, por psicólogos e até os novos parapsicólogos, que estão surgindo, usam também em grande escala a hipnose para recordações de vidas anteriores. Freud lutou por muitos anos contra um câncer na boca e morreu por eutanásia ( EUTANÁSIA - SEUS ÚLTIMOS DIAS, por Peter Gay) em 23 de setembro de 1939 com grande influência na cultura do século XX. É de grande importância o estudo de Freud por psicólogos, psicanalistas e parapsicólogos, pelo estudo e entendimento para ajudar os pacientes do nascer e do passado-presente-futuro a fim de se manter e entender os meandros da vida emocional.
Pesquisa: Bibliografia: !A Vida e Obra de Sigmund Freud " por Ernest Jones


As obras de Freud
Estudos sobre a histeria (com Josef Breuer, título original Studien über Hysterie, 1895) recebesse a aclamação.
A interpretaçõo dos sonhos (título original Die Traumdeutung, 1900) para que o psicanalista consiga montar um modelo da estrutura do inconsciente daquela pessoa..
Sobre a psicopatologia da vida cotidiana (Título original Zur Psychopathologie des Alltagslebens, 1901) Três ensaios sobre a teoria da sexualidade (título original Drei Abhandlungen zur Sexualtheorie, 1905)
Os chistes e a sua relação com o inconsciente (título original Der Witz und seine Beziehung zum Unbewußten, 1905).
Totem e Tabu (título original Totem und Tabu, 1913)
Além do princípio do prazer (título original Jenseits des Lustprinzips, 1920)
O Ego e o Id (título original Das Ich und das Es, 1923)
O mal-estar na civilização (título original Das Unbehagen in der Kultur, 1930)
Moisés e monoteísmo (título original Der Mann Moses und die monotheistische Religion, 1939) Fonte: Instituto Luzes de desenvolvimento humano
Obra resenhada

Para Freud, nenhuma das aplicações da psicanálise excitou tanto interesse e despertou tantas esperanças e atraiu tantos colaboradores capazes, quanto seu emprego na teoria e prática da educação. É fácil compreender por quê, as crianças se tornaram o tema principal da pesquisa psicanalítica e substituindo, os neuróticos com os quais ela iniciou seus estudos. A análise demonstrou como a criança continua a viver, quase inalterada, no doente, lançou luz sobre as forças motivadoras e tendências que estampam seu selo característico sobre a natureza infantil e traçou os estádios através dos quais a criança chega à maturidade. Não é de admirar, portanto, que tenha surgido a expectativa de que o interesse psicanalítico nas crianças beneficiaria o trabalho da educação, cujo objetivo é orientar e assistir as crianças s em seu caminho para diante e protegê-las de se extraviarem.

Segundo o autor, ele menciona que sua cota pessoal na aplicação da psicanálise foi leve. Em um primeiro estádio, diz ele - aceitei o bon mot que estabelece existirem três profissões impossíveis - educar, curar e governar – eu já estava inteiramente ocupado com a segunda delas. Isto, contudo, não significa que desprezo o alto valor social do trabalho realizado por aqueles de meus amigos que se empenham na educação.

O presente volume da autoria de August Aichhorn interessa-se por um setor do grande problema: a influência educacional de delinqüentes juvenis. O autor trabalhou como diretor de instituições municipais para deliquentes, antes de ter-se familiarizado com a psicanálise. Sua atitude para com seus encargos origina-se de uma cálida simpatia com a sorte desses infelizes e foi corretamente guiada por uma percepção intuitiva de suas necessidades mentais. A psicanálise praticamente pouco pôde ensinar-lhe algo que fosse novo, porém lhe trouxe uma clara compreensão interna ( insight ) teórica da justificativa de seu modo de agir e colocou-o em posição de explicar seu fundamento a outras pessoas.

Para o autor, não se deve presumir que esse dom de compreensão intuitiva seja encontrado em todos aqueles que se interessaram pela educação de crianças. Segundo ele, duas lições se pode derivar da experiência e do sucesso de August Aichhorn. Uma é que toda pessoa desse tipo deveria receber uma formação psicanalítica

A segunda lição. Afirma-se no sentido de que o trabalho da educação é algo sui generis: não deve ser confundido com a influência psicanalítica e não pode ser substituído por ela. A psicanálise pode ser convocada pela educação como meio auxiliar de lidar com uma criança, porém não constitui um substituto apropriado para a educação. Tal substituição não só é possível em fundamentos práticos côo também deve ser desaconselhada por razões teóricas.
Não devemos deixar-nos desorientar pela afirmação - incidentalmente uma afirmação perfeitamente verídica - de que a psicanálise de um neurótico adulto é equivalente a uma pós-educação. Uma criança, mesmo uma criança desorientada e delinqüente, ainda não é um neurótico, e a pós-educação é algo inteiramente diferente da educação dos imaturos. A possibilidade de influência analítica repousa em precondições bastante definidas, que podem ser resumidas sob a expressão ‘situação analítica’; ela exige o desenvolvimento de determinadas estruturas psíquicas e de uma atitude específica para com o analista..
O autor encerra com uma inferência, importante não para a teoria da educação, mas para a condição daqueles que estão empenhados na educação. Se um deles aprendeu a análise por experimentá-la em sua própria pessoa, e está em posição de poder empregá-la em casos fronteiriços e mistos, a fim de auxiliá-lo em seu trabalho, obviamente deverá ter o direito de praticar a análise; e não se deve permitir que motivos mesquinhos tentem colocar obstáculos em seu caminho.

Apreciação da resenha

Freud, se refere a três profissões consideradas para ele como impossíveis: governar, educar e curar. Essas profissões representam na teoria freudiana, diferentes maneiras de fazer laço, diferentes maneiras de tentar contornar o impossível.
Petri (2003) nos lembra que o laço é um nó que se desata sem esforço. Temos assim, que os laços sociais que os discursos tentam articular são provisórios, frágeis, incapazes de amarrar todo o real presente. Com efeito, todas essas modalidades de laço carregam em si algo do real, pois sempre haverá uma perda, sempre haverá um mal-estar, sempre haverá um mal-entendido; algo do impossível de ser todo representado. Sendo assim, afirmar que analisar é uma tarefa impossível é partir de uma referência importante: sempre haverá alguma espécie de fracasso nessa forma de laço.
Todavia, a questão do fracasso inerente a toda e qualquer tentativa de produzir enlaçamento, vai adquirir uma posição especial na forma de laço inaugurada pela psicanálise. Freud atribui a dificuldade dessas três missões – educar, curar e governar – obterem êxito pleno ao fato de que, por lidarem com o ser humano, estão vinculadas a forças pulsivas e sócio ‐ culturais, o que torna impossível atingir plenamente os objetivos idealmente desejáveis.

Freud acreditava já naquela época, que a Educação não tem cumprido sua tarefa, causando às crianças graves prejuízos. Mesmo sabendo que o educador tinha necessidade de receber uma formação em Psicanálise. Freud reconhece que "a educação não deve ser confundida com a influência psicanalítica e não pode ser substituída por ela".

Referência Bibliográfica
FREUD, S. Prefácio a "Juventude desorientada" de Aichhom In: SALOMÃO, J. (Edit.) Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud, Rio de Janeiro:
Imago, 1976, v.19.