quinta-feira, 15 de julho de 2010

Psicanálise e Educação

A função da escola sofreu alterações através dos séculos. A escola da idade Média acolhia da mesma maneira crianças, jovens e velhos; ela acolhia àqueles interessados nos hábitos escolares. Os pedagogos da Idade Média não privilegiando medidas educacionais no período da infância e da adolescência estendiam-na a toda duração da vida humana.
Só no final do século XVII, que a educação começa a privilegiar crianças e adolescentes. Foram homens detentores da autoridade,da razão e do saber que compreenderam a particulariidade da infância e a importância tanto moral como social da educação; e da formação das crianças em instituições especiais adaptadas a esta finalidade.
Vários métodos educacionais foram inventados no decorrer dos séculos. Em alguns, a palavra da criança não se escutava, não podendo haver nenhuma manifestação de seu desejo. Ficando a criança como modelo em função dos ideais de seus pais e professores. E em outros, ditos liberadores, os educadores não tinham a preocupação de transmitir conhecimentos, as crianças não eram obrigadas a aprender.

A esperança de S. Freud de que a psicanálise podia contribuir para que nossas crianças fossem menos neuróticas do que seus antecessores certamente fracassou. Mas é possível que sua maior inteligência seja mais do que uma mera impressão. É bem possível que nossos atuais pedagogos, valendo-se de uma torção psicanalítica do discurso, ainda sem sabê-lo plenamente, estejam abrindo um bom caminho para que o sujeito do inconsciente possa manifestar o que sabe sem tropeçar com educadores que, brandindo à destra e à sinistra as espadas já forjadas do conhecimento, dediquem-se, como nas épocas douradas do racionalismo, a recortar mais e mais a imaginação.
Na Europa e na América do Norte, os conhecimentos derivados da psicanálise vêm sendo usada na educação já há um bom tempo. A psicanálise para quem lida com educação Não é um tratamento. A psicanálise é constituída de duas partes: As teorias sobre o funcionamento humano em termos psicológicos, e as técnicas de tratamento, o conhecimento psicanalítico fornece fundamentos para uma série de atividades, tais como a educação, a psicologia (individual e social), agora a psicopedagogia, etc.
Falar em psicanálise e educação, não podemos deixar de citar Winnicott que foi pediatra por 40 anos, além de psicanalista, e teve um contato muito prolongado com um número enorme de crianças que só estavam doentes fisicamente, e podiam ser consideradas psicologicamente saudáveis. Esse contato com as crianças que não tinham qualquer comprometimento psicológico o convenceu, de que a psicanálise não podia restringir-se à compreensão da doença psíquica, precisava ir além e tentar entender o funcionamento da mente humana sem a interferência da doença..
O ponto mais importante na abordagem de Winncott na questão da educação e da aprendizagem é que ele percebeu uma coisa que outros psicanalistas não viram, e que é a espontaneidade e tudo aquilo que gira em torno dela ou de sua ausência, por exemplo, um aluno que aprende bem porque é submisso e outro que aprende bem porque é espontâneo. A diferença está em que o aluno espontâneo talvez não tire notas tão boas quanto o submisso, mas terá muito mais curiosidade, terá muito mais idéias próprias, fará muito mais ligações entre as várias coisas aprendidas, e assim por diante. Conseqüência: ele usará bem melhor os conhecimentos adquiridos quando estiver fora da escola. Essa diferença não era muito apreciada, até pouco tempo atrás. E então as escolas começaram a se preocupar com a espontaneidade e a não-submissão. Winnicott discute tudo isso, mas a partir das próprias bases iniciais do desenvolvimento emocional da criança, e esse conhecimento é fundamental para quem quer ter realmente uma boa noção de como funcionam crianças normais.
Winnicott deu grande importância ao fenômeno da espontaneidade. É como se até então a psicanálise considerasse que o indivíduo age a partir do esquema estímulo – resposta, e ele foi o primeiro a dar importância ao comportamento que na verdade não está respondendo a estímulo nenhum. Por isso ele fala da diferença entre agir e reagir, e o que sabemos é que muita gente – criança ou não – quase nunca consegue agir, em geral fica esperando que ocorra um estímulo para então reagir a ele. (Muita gente não sabe o que fazer nos fins de semana, por exemplo, ou num feriado. Fica perdida.) Winnicott percebeu que o indivíduo humano é naturalmente criativo desde o início, e que o bebê inventa brincadeiras espontaneamente. Disso todo o mundo sabe, é claro, mas até então ninguém percebeu o quanto isso era importante. Ora, justamente por isso essa espontaneidade poderia ser reprimida, impedida, e isso acontece muitas vezes desde muito cedo na vida do bebê. Quando esse desastre não acontece, a espontaneidade e a criatividade da criança naturalmente agem no sentido de fazer coisas, e de aplicar a fantasia (o “produto” da criatividade) aos movimentos e à manipulação de objetos – aquilo que chamamos de ‘brincar’. Com isso, a criança age sobre o mundo à sua volta, descobrindo coisas e inventando outras, pelo puro prazer de fazê-lo. Ela se sente agente, sujeito, ou outro nome que se dê a isso, e isto cria a capacidade de aprender como conquista, como exercício da própria vontade, o que é muito diferente de aprender como submissão à vontade do outro. E é justamente essa atividade – o brincar – que permite a esse processo de aprendizagem como conquista instalar-se e transformar-se na base de tudo aquilo que nós adultos chamamos de aquisição da cultura. O conhecimento, a cultura, portanto, do ponto de vista de Winnicott, podem ser algo de que a gente se apossa, ou algo que se apossa da gente
“A Psicanálise é como um caminho que pode propiciar uma ética que valoriza a tolerância, a singularidade e o desejo possível ao homem, principalmente porque esta depende dele mesmo, de algo que o ajude em seu sofrimento, ao levá-lo a tomar posse de si mesmo”.

Como se dá o processo psicanalítico institucional?
Ora, sabemos que nas escolas temos uma diverssidade cultural enorme e pode desencadear violências irreparáveis. Então o processo psicanalítico institucional se dá pela posição em que o psicanalista se coloca, da escuta de uma subjetividade, no limbo onde as palavras, os suspiros e os ritmos fazem uma dança diferente do que o conteúdo de seus enunciados poderia nos fazer pressupor. É porque a palavra é destituída de seu valor comunicacional usual que o processo analítico se instala. Pela atenção flutuante do analista, que pode tê-la por seu próprio inconsciente analisado e da associação livre do aluno (a) vez detectada a queixa.
Para a Psicanálise, é uma fantasmática que estrutura o comportamento da vida de cada ser, as estruturas fantasmáticas procurando se exprimir, encontrar uma saída para a consciência e ação e, por isso, seu material não é só feito da sexualidade infantil recalcada e, portanto, inconsciente, mas também de novos materiais que são atraídos a ele. O fantasma é tal qual um espantalho, composto de pedaços de coisas desconexas, cada um de um lugar, resíduos de frases escutadas, restos de imagens, uma espécie de montagem surrealista construída em cima de um pensamento simples e curto que por várias razões teve de ser reprimido. A interpretação psicanalítica visa dissipar o fantasma e nesse sentido o psicanalista é um caçador de fantasmas que, em sua posição, permite àquilo que é de outra cena, marcada pela sexualidade infantil, se manifestar.
A escuta psicanalítica percorre um árduo caminho para pulverizar o fantasma no vazio entre os corpos em que ele se instalou, restituindo-o a seus corpos de origem, para
O que a Psicanálise traz de precioso para qualquer situação é seu dispositivo de escuta, a eficácia mágica do deixar falar, os conteúdos latentes que surgem, os não ditos, as recorrências e repetições, as redes e interligações de novas falas que este dispositivo de escuta permite. É

Possibilidades da psicanálise

Este dispositivo de escuta psicanalítica, ou melhor, seus pressupostos, que permitem uma abertura inédita ao discurso do outro, em que o outro se vê ativamente podendo assumir um discurso mais problemático e complexo, mas mais verdadeiro, sobre si e sobre seu meio de trabalho, que está ganhando espaço em outras áreas de atuação. Isto vale para o campo da Saúde, mas também para o campo da Educação, cujos ecos vemos na abordagem construtivista do ensino/aprendizagem. Por exemplo, seja num aconselhamento relativo à AIDS ou em situações de violência, se você não singulariza, se você não conhece as condições de vida da pessoa para saber porque é que é naquele momento e não em outro que ela está procurando ajuda, você não consegue ouvi-la de verdade, o que dificultará em muito a ela também escutar você. Isto é uma verdade que se torna cada vez mais evidente no campo da prevenção. Agora, se você “gasta” um encontro para saber da própria pessoa porque ela está ali, como é a vida dela, o que ela está sentindo ou como está afetada, você consegue um envolvimento que permite um engajamento com aquilo que você tem a propor que também se modifica com aquilo que você ouve. I


A psicanálise contribui para a pratica psicopedagogia na avaliação e interpretação do comportamento e no tratamento do educando com déficit de aprendizagem ou distúrbio comportamental que comprometa seu desenvolvimento escolar, e ou do grupo no qual ele esteja inserido.Considerando a psicanálise um método criado por Sigmundo Freud e aperfeiçoado por seus discípulos, ela poderá auxiliar a psicopedagogo na análise das desordens mentais e emocionais que constituem a e emocionais que constituem a estrutura dos neuroses psicoses do educando, por meio de uma investigação profunda dos processos mentais conscientes e inconscientes do indivíduo.
Psicanálise, portanto, trouxe muito instrumental para pensar que existe uma verdade que é sempre singular, provisória, que se desfaz e se reconstitui e que tem um movimento. Se é assim para o homem singular, talvez o seja também no movimento dos saberes, das formas constantemente reinventadas de produção de conhecimento. A descoberta da noção de inconsciente produziu um deslocamento fantástico, a de que “o homem não é senhor em sua própria casa”, considerada por Freud a terceira ferida narcísica da humanidade, depois de o homem descobrir que a terra não era o centro do universo e que o homem descendia do macaco. Agora, o próprio inconsciente não é algo estático, um saquinho que contém coisas escondidas, fruto do recalque, esperando para serem descobertas como um tesouro pronto. Ele é pura associação virtual, que se precipita, que pode se atualizar, partindo de um sonho, de traços de memória de certos pensamentos, desejos infantis de cunho sexual no sentido amplo.
Muito se tem falado sobre a problemática da educação: professores insatisfeitos, alunos desinteressados, drogas nas escolas, violência de alunos a colegas e professores, defasagem escolar, índices de analfabetismo, promessas de melhores salários e muito mais. A que se deve a instalação desse caos que hora se apresenta, angustiando pais e professores e toda uma sociedade e tornando a escola também vítima da violência? Todo respeito e valor que a escola tinha outrora caíram por terra e a instituição se apresenta à mercê da transgressão, do descrédito e desrespeito de discentes e docentes. Não se deve esquecer que a educação busca ignorar a realidade da condição humana, quando procura enquadrar o aluno a normas que acredita o façam aprender, tornar-se um ser ideal. A educação é por si só normativa, violenta, repressiva porque visa adaptar a criança à aceitação social, o que vai de encontro a tudo que ela viveu no ambiente familiar. A relação com a educação é ambígua, contraditória, antagônica podendo-se falar numa relação de amor e ódio, uma vez que a amamos porque dela necessitamos e ao mesmo tempo a odiamos pelo fracasso que às vezes nos traz. Os educadores deveriam conhecer toda influência que sofre a formação psíquica da criança desde seus primeiros anos de vida no ambiente familiar na sua relação com pais, irmãos, avós e babás. Influências estas que vão se refletir na sua personalidade e que irão perdurar por toda sua vida adulta. Possuidores desse conhecimento, o professor precisa se reconciliar com a criança que habita em cada um e a partir daí entender melhor seu aluno para que o papel de professor e educador seja realmente entendido por ele. Conceitos e postura ética deverão ser revistos na tentativa de se evitar abusos do poder que sua posição lhe confere, não submetendo o aluno a esse poder e tendo sempre em vista os limites de sua ação. Deve refletir sua prática pedagógica, estar atento ao que se passa na mente de seus alunos, procurar conhecer sua individualidade psíquica através de pequenos gestos que às vezes escapam, tais como mudanças de atitude e de comportamento no seu dia a dia em sala de aula. Atitudes como essas revelam amor, carinho, atenção, sentimentos esses que muitas crianças não têm com seus familiares e às vezes nem mesmo os tem. Autoridade e limites não podem nem devem ser esquecidos, pois também são gestos de carinho e atenção, afinal somente quem ama cuida. O aluno precisa e deve entender que o professor é amigo, companheiro, porém a escala hierárquica deve ser observada e entendida por ele. As diferenças individuais devem ser respeitadas pelo professor, que muitas vezes por não saber lidar com a rejeição, rejeita o aluno responsabilizando-o pela ausência do desejo de aprender. O conhecimento é o objeto do desejo que se propaga na relação professor-aluno, é fruto da identificação que o aluno tem com o professor, que tem papel fundamental em despertar esse desejo.
O mestre funciona como dirigente desse processo que se dá nessa relação triangular. Triangular sim, pois o aluno aprende quando se identifica com o professor, vendo-o como alguém que lhe foi muito querido, lembrança dos primórdios de sua infância. O aluno imagina que o professor detém todo o saber e o mestre precisa estar atento a isto, sabendo que este conhecimento não é absoluto, podendo ser ampliado, modificado e acrescido, pois novos saberes sempre são adquiridos. O desejo de aprender é muito mais importante que métodos e técnicas. Não existem fórmulas mágicas para solucionar os problemas de aprendizagem, mas sempre ir ao encontro de conhecimentos teóricos que sejam valiosos para sua prática pedagógica, refletindo e dando novo significado a sua atuação diária, modificando-a. Especialistas da escola juntamente com o corpo docente precisam buscar um espaço de fala e escuta regular, onde ocorram trocas de idéias e experiências, mesmo que seja nos cursos de formação continuada, onde as pessoas envolvidas com a educação possam re-significar suas convicções, vontades e ações como profissionais que buscam uma prática mais eficiente para todos. O desafio que se coloca é buscar o ponto de equilíbrio que se faz necessário para a educação de forma que ela se torne mais producente e prazerosa para professores e alunos; que ela possa orientar a criança nos seus limites; que os professores tenham um auto-conhecimento tal que lhes permita não se sentirem senhores absolutos nem um ser esvaziado de seu desejo; que a singularidade de cada sujeito envolvido no processo seja preservada e que os diálogos sejam alicerçados com base na ética e no respeito ao outro, seja ele professor ou aluno. Diante de tudo isso, conclui-se que a Educação pode ser realizada com a colaboração de determinados conhecimentos de si mesmo e do outro por parte do docente, tornando-a talvez menos problemática e mais producente para os envolvidos no processo, mas conscientes de que jamais se dará de forma completa, integral. Sempre se fará presente como obstáculo o desejo e a falta humana que fazem parte da estrutura do sujeito e é impossível de ser preenchida com objeto real, mas a busca é incessante e surge como ausência de um objeto que povoou suas fantasias infantis e que foi para sempre perdido.
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Referencias
Neusa Lais Coelho Psicanalista - Membro da Escola da Causa Analítica Instituto Tempos Modernos.
Liria Helena Moreira Gomes Littig- Professora de matemática pós-graduada em planejamento educacional, psicanalista pós-graduada em teorias psicanalíticas e Práticas Educacionais.

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